Em seus vasos no jardim,
preguiçosamente instaladas, flores e verdes num silêncio
profundo, como acontece em todo o mundo.
De repente um grito: - Ela vem
vindo! Vamos fingir que estamos dormindo!
Equipada com tesoura, vassoura,
regador e pá, chega Maricota ao jardim e logo percebe o ar de indiferença
forçada em suas plantinhas amadas. Margaridinha virou seus ramos e flores para
outro lado, fingindo não perceber a chegada da jardineira, sempre tão faceira. Azaleia
fingiu sono, ensaiando um cochilo; enquanto os gerânios cochichavam uns com os
outros, fingindo analisar seus pistilos. Outras plantas, mais tímidas,
assistiam a cena sem qualquer manifestação, contendo a admiração.
Sem rodeios, Maricota foi logo
cumprimentando e em seguida perguntando:
- Bom dia, queridas! Estão com
saudades de mim?
A azaleia, majestosa e muito sem
querer se pôs a responder:
- Nem pensar! E hoje é domingo,
estamos saindo para o jasmim visitar.
Percebendo um certo ar de
ressentimento, dona Maricota tentou convencer:
- Mas pensei muito em vocês, em
cuidá-las outra vez.
A flor-de-mel, com um ar
aborrecido esbravejou num tremido:
- Não queremos nos arrumar, deixa
o vento estragar!
Tentando uma conciliação,
Maricota deu uma explicação.
- Mas é preciso, a primavera vai
chegar! Vocês todas vão gostar!
A malva, muito biliosa, tratou de
retrucar:
-Por que tanto interesse? Passavas
e nem nos olhavas! Florescemos a valer para nos olhares outra vez.
Maricota, sempre muito
persistente, a irritada malva acariciou e a todas com simpatia explicou:
- Sinto muito, minhas lindas, eu
estava muito cansada, sem tempo pra quase nada.
O pingo-de-ouro, antevendo seu
destino, berrou como um militar em guerra.
- Mas em nós não tocas não, chega
pra lá com esta mão e com este baita tesourão!
A tesoura, muito meiga e
constrangida, tratou de amenizar.
-Vou cortar só um pouquinho, mas
como se fosse um carinho!
A pá de lixo, costumeiramente
muito metida, resolveu se intrometer. Olhando para a flor–de-mel exclamou a descrever:
-Céus como estás escabelada!
Galhos secos e flores misturadas!
Maricota, examinou aos gerânios e
a um deles perguntou:
- E que bichinhos são estes,
grudados nos teus raminhos?
Com um ar triste a pobre flor do
gerânio explicou.
- É cochonilha branquinha, que me
deixa bem magrinha.
Compadecida, Maricota sentenciou:
- Então vamos limpar, para você
hidratar.
A vassoura, muito solícita, foi
logo se pronunciando:
- Prometo que só vou parar,
quando o jardim embelezar.
Maricota ia fazendo a limpeza nos
gerânios, limpando as cochonilhas, que muito a contra gosto, desgrudavam dos
ramos da plantinhas. Enquanto limpava a todas falava:
- São minhas preferidas e sempre
as mais queridas!
A tesoura, com voz levemente
rouca e melosa, pedia licença para cortar os galhos secos das agitadas
plantinhas chorosas. As violetas, muito frágeis e dengosas, logo cederam ao
carinho da tesoura, que afirmava não ser dolorosa.
- Se é assim mesmo, deixamos, mas
se doer te avisamos - diziam elas em sua meiguice.
E a tesoura ia cortando, muito
disposta confortando. Folhas secas e amarelas teriam que sair delas.
- Não vai doer não, todas vão
ficar limpinhas e só com as folhas verdinhas.
Ao ver seu vaso arrastado
margaridinha gritou:
- Ai, credo, ela vai me trocar de
lugar, para onde vai me levar!?
A vassoura, muito segura, tratou
de ser categórica.
- Calma, margaridinha, só quero
fazer uma limpezinha, o teu vaso está muito sujo, tem até um caramujo.
Azaleia, cheia de indignação,
teve um ataque de tosse. Pediu à Maricota mais consideração
- Cof! Cof! Larga essa vassoura!
Te prefiro com a tesoura!
A pá que era de pouca fala, mas
muito metida, interveio, querendo se meter no meio.
Mas a vassoura ralhou, pois a pá
se engasgou.
- Calma, dona azaleia, é preciso
cuidar, para muito limpo ficar! Eu estou gastando as minhas cerdas de tanto
esfregar e você não para de reclamar!
Depois de tanto trabalho, chão
limpo, galhos e folhas secas ensacados, o regador, que até ali era mero
observador, resolveu soltar o verbo e como um mestre de cerimônia anunciou o
encerramento com toda a parcimônia.
- Agora para finalizar vou molhar
para hidratar. Para cada menina, água com vitamina!
Maricota, cheia de orgulho de tão
bom resultado, perguntou ansiosa, olhando para todo lado:
- E agora minhas lindinhas, que tal,
se sentem limpinhas?
Muitas vozes responderam de cada
modo diverso, que se sentiam muito bem, as mais lindas plantas do universo.
Mas eis que um grito de socorro
ecoa do saco plástico, fazendo Maricota,
seus equipamentos e as plantas levar um susto fantástico.
Correndo em direção ao saco,
Maricota olhou para dentro dele e perguntou quem gritava, pois da voz se
admirava.
- Somos nós, os galhos e as
folhas secas, quem mais poderia ser? Tiraste a nossa moradia, pensamos que isso
não aconteceria. Vais nos mandar embora, colocando-nos fora?
Maricota sorrindo acalmou o monte
ensacado.
De jeito nenhum, vocês são
importantes, só não ficarão onde estavam antes. Misturados com minhocas farão
um belo composto, pelo qual as plantas têm muito gosto!
E assim com todos contentes
encerrou o rebuliço, mas eu só quis dizer isso.
Da criança criativa que
sobreviveu em mim, apesar dos pesares, para as crianças criativas, ainda crianças, apesar dos pesares.
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