quarta-feira, 27 de junho de 2012

Rebuliço no jardim.



Em seus vasos no jardim, preguiçosamente instaladas, flores e verdes num silêncio profundo, como acontece em todo o mundo.
De repente um grito: - Ela vem vindo! Vamos fingir que estamos dormindo!
Equipada com tesoura, vassoura, regador e pá, chega Maricota ao jardim e logo percebe o ar de indiferença forçada em suas plantinhas amadas. Margaridinha virou seus ramos e flores para outro lado, fingindo não perceber a chegada da jardineira, sempre tão faceira. Azaleia fingiu sono, ensaiando um cochilo; enquanto os gerânios cochichavam uns com os outros, fingindo analisar seus pistilos. Outras plantas, mais tímidas, assistiam a cena sem qualquer manifestação, contendo a admiração.
Sem rodeios, Maricota foi logo cumprimentando e em seguida perguntando:
- Bom dia, queridas! Estão com saudades de mim?
A azaleia, majestosa e muito sem querer se pôs a  responder:
- Nem pensar! E hoje é domingo, estamos saindo para o jasmim visitar.
Percebendo um certo ar de ressentimento, dona Maricota tentou convencer:
- Mas pensei muito em vocês, em cuidá-las outra vez.
A flor-de-mel, com um ar aborrecido esbravejou num tremido:
- Não queremos nos arrumar, deixa o vento estragar!
Tentando uma conciliação, Maricota deu uma explicação.
- Mas é preciso, a primavera vai chegar! Vocês todas vão gostar!
A malva, muito biliosa, tratou de retrucar:
-Por que tanto interesse? Passavas e nem nos olhavas! Florescemos a valer para nos olhares outra vez.
Maricota, sempre muito persistente, a irritada malva acariciou e a todas com simpatia explicou:
- Sinto muito, minhas lindas, eu estava muito cansada, sem tempo pra quase nada.
O pingo-de-ouro, antevendo seu destino, berrou como um militar em guerra.
- Mas em nós não tocas não, chega pra lá com esta mão e com este baita tesourão!
A tesoura, muito meiga e constrangida, tratou de amenizar.
-Vou cortar só um pouquinho, mas como se fosse um carinho!
A pá de lixo, costumeiramente muito metida, resolveu se intrometer. Olhando para a flor–de-mel exclamou a descrever:
-Céus como estás escabelada! Galhos secos e flores misturadas!
Maricota, examinou aos gerânios e a um deles perguntou:
- E que bichinhos são estes, grudados nos teus raminhos?
Com um ar triste a pobre flor do gerânio explicou.
- É cochonilha branquinha, que me deixa bem magrinha.
Compadecida, Maricota sentenciou:
- Então vamos limpar, para você hidratar.
A vassoura, muito solícita, foi logo se pronunciando:
- Prometo que só vou parar, quando o jardim embelezar.
Maricota ia fazendo a limpeza nos gerânios, limpando as cochonilhas, que muito a contra gosto, desgrudavam dos ramos da plantinhas. Enquanto limpava a todas falava:
- São minhas preferidas e sempre as mais queridas!
A tesoura, com voz levemente rouca e melosa, pedia licença para cortar os galhos secos das agitadas plantinhas chorosas. As violetas, muito frágeis e dengosas, logo cederam ao carinho da tesoura, que afirmava não ser dolorosa.
- Se é assim mesmo, deixamos, mas se doer te avisamos - diziam elas em sua meiguice.
E a tesoura ia cortando, muito disposta confortando. Folhas secas e amarelas teriam que sair delas.
- Não vai doer não, todas vão ficar limpinhas e só com as folhas verdinhas.
Ao ver seu vaso arrastado margaridinha gritou:
- Ai, credo, ela vai me trocar de lugar, para onde vai me levar!?
A vassoura, muito segura, tratou de ser categórica.
- Calma, margaridinha, só quero fazer uma limpezinha, o teu vaso está muito sujo, tem até um caramujo.
Azaleia, cheia de indignação, teve um ataque de tosse. Pediu à Maricota mais consideração
- Cof! Cof! Larga essa vassoura! Te prefiro com a tesoura!
A pá que era de pouca fala, mas muito metida, interveio, querendo se meter no meio.
Mas a vassoura ralhou, pois a pá se engasgou.
- Calma, dona azaleia, é preciso cuidar, para muito limpo ficar! Eu estou gastando as minhas cerdas de tanto esfregar e você não para de reclamar!
Depois de tanto trabalho, chão limpo, galhos e folhas secas ensacados, o regador, que até ali era mero observador, resolveu soltar o verbo e como um mestre de cerimônia anunciou o encerramento com toda a parcimônia.
- Agora para finalizar vou molhar para hidratar. Para cada menina, água com vitamina!
Maricota, cheia de orgulho de tão bom resultado, perguntou ansiosa, olhando para todo lado:
- E agora minhas lindinhas, que tal, se sentem limpinhas?
Muitas vozes responderam de cada modo diverso, que se sentiam muito bem, as mais lindas plantas do universo.
Mas eis que um grito de socorro ecoa  do saco plástico, fazendo Maricota, seus equipamentos e as plantas levar um susto fantástico.
Correndo em direção ao saco, Maricota olhou para dentro dele e perguntou quem gritava, pois da voz se admirava.
- Somos nós, os galhos e as folhas secas, quem mais poderia ser? Tiraste a nossa moradia, pensamos que isso não aconteceria. Vais nos mandar embora, colocando-nos fora?
Maricota sorrindo acalmou o monte ensacado.
De jeito nenhum, vocês são importantes, só não ficarão onde estavam antes. Misturados com minhocas farão um belo composto, pelo qual as plantas têm muito gosto!
E assim com todos contentes encerrou o rebuliço, mas eu só quis dizer isso.


Da criança criativa que sobreviveu em mim, apesar dos pesares, para  as crianças criativas,  ainda crianças, apesar dos pesares.

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