quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O Romeu drogado ou Vera querida, eu chi amo! Parte 2


Subitamente entra no plantão Vera querida, acompanhada por dois brigadianos que conduziam o Romeu drogado. Inconformado, este exclamava seu amor pela cabeleireira, tal como acontecera alguns dias antes. Um único pensamento passou por minha cabeça: -De novo!!! A violação das medidas protetivas levou o casal até nós, num curto espaço de tempo. Os colegas da BM explicaram brevemente o que havia ocorrido. Sendo hora do almoço, o plantonista dera uma rápida saída, aliás, como os demais da DP. Apenas eu, um colega da Volante e Deus estávamos no prédio. Eu dizia tantos “ai meu Deus”, que, suponho, Ele desceu do céu para o plantão. Os PMs foram chamados para outra ocorrência, saíram para retornar mais tarde. A cabeleireira foi em busca de algum alimento. Ali permanecemos com o Romeu choroso, que imediatamente anunciou que poria fim a própria vida. Deixamos que fizesse sua cena, apenas observando o protagonista, até ele começar a bater com a cabeça na parede.  Meu colega tentou fazê-lo parar, advertindo-o sobre os ferimentos, eticetera, eticetera, e nada, a gritaria continuou, acompanhada das cabeçadas. A possibilidade do sujeito ficar com lesões nos deixou preocupados. Sabíamos da nossa responsabilidade pela integridade física do preso. Preocupava-nos a possibilidade do preso adquirir lesões sob a nossa custódia e, também, por estarmos os dois em estágio probatório. Bateu a insegurança. As pessoas passavam na calçada e espiavam pelas janelas da delegacia. Os gritos aguçavam a curiosidade dos passantes. Meu colega pediu que eu segurasse o Romeu, enquanto telefonava solicitando o retorno da PM. Cruzei as mãos atrás do pescoço do homem autolesivo e passei a puxá-lo para frente, para impedir que sua cabeça batesse na parede. Da janela, as pessoas me viam puxar a criatura em minha direção e ele a gritar. Eu suava muito com o esforço e estava bastante tensa por participar daquela cena, no mínimo, estranha. Não podíamos pedir ajuda aos transeuntes! Ficaria na história da pequena cidade o pedido de socorro da polícia aos cidadãos. Comecei a ficar preocupada com o ridículo da situação; a platéia, que agora era minha e dele, poderia interpretar que eu assediava o preso, e que ele gritava por não aceitar o assédio. Finalmente meu colega terminou os telefonema. Pude, então, interromper aquela ridicularia. Busquei algo para amortecer as cabeçadas. Abençoado Código Penal! Funcionou, graças ao bom Deus! O plantonista retornou, para nosso alívio, e junto chegaram os PMs, fato que modificou a conduta do Romeu tornando-se muito calmo. Hoje, ao lembrar o episódio, percebo que a minha inexperiência, assim como a do colega, certamente deram asas ao abuso de paciência por parte daquela criatura, que encenou o tempo inteiro, deixando-nos em estado total de exaustão. Iniciado o registro da ocorrência, ficamos sabendo que nosso preso escandaloso tinha um histórico de muitas confusões, não trabalhava e vivia às custas da cabeleireira viúva. Dela provinha o dinheiro para as drogas. Estava com 29 anos de idade, e Vera querida com 53. Pelo que pude apurar, ela recebia uma pensão em razão da viuvez. Pode parecer pouco, mas é comum, em grupos menos favorecidos, uma mãe que recebe bolsa família por dois ou três filhos virar alvo de parasitas de tipos como o Romeu. Pois é, o nosso “herói” tinha razões para espernear. A perda da galinha dos ovos de ouro, certamente, o deixava muito preocupado. Vera querida agora se comportava como uma mãe austera, ameaçando abandoná-lo, sem dinheiro para suas “pedrinhas”. Pensam que terminou por aí? Não! Apesar das afirmativas contrárias, a cabeleireira voltou ao convívio de seu amado que, embora fosse um estorvo, a fazia sentir-se invejada em razão de ser um companheiro tão jovem.  Soubemos da reconciliação quando, duas semanas mais tarde, ela retornou à delegacia acompanhada do irmão, da cunhada e de uma sobrinha, os quatro se dizendo ameaçados de morte pelo Romeu drogado. Ela evitava olhar em minha direção. Dava para perceber que Vera querida sabia haver esgotado a cota de paciência de todos os presentes, particularmente, a minha, uma vez que eu já me expressara de forma bastante clara sobre aquele circo que o casal formava com seus desentendimentos.  O abençoado celular da Volante tocou chamando para um trabalho externo, o que teve o valor de um presente para mim. Pensei: -Adeus, Vera querida! De preferência, até nunca mais!!! Mas eu só quis dizer. 

2 comentários:

  1. tem a parte 3? Vera querida daria um livro!

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  2. Silvinha, adorei o teu conto da realidade policial. Sou agora teu leitor assíduo. Grande beijo. Uirassú

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