tag:blogger.com,1999:blog-75124386077732579392023-11-15T10:08:15.876-08:00Reflexões no meio do caminho.Unknownnoreply@blogger.comBlogger37125tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-38124822356541517342014-11-15T12:32:00.000-08:002017-03-19T16:24:29.715-07:00Sobre trabalho, educação, respeito e ansiolíticos, necessariamente nessa mesma ordem.<div align="JUSTIFY">
Um grupo de trabalho é um grupo social como tantos
outros. Nele convivemos com colegas e suas características. O gestor
deve ser membro acessível, convivendo, observando para conhecer o grupo em suas peculiaridades e, assim, melhor aproveitar as potencialidades
de cada elemento. A observação criteriosa pode indicar necessárias alterações. A perspicácia, qualidade fundamental ao bom gestor, guia a solução de conflitos, a condução da “tribo” da forma mais proveitosa e harmônica possíveis. Um grupo de trabalho é naturalmente diversificado, em vista das peculiaridades de seus componentes.
Gestão é talento. Não se trata de imposição absoluta ou delegação
comodista. Dito isso, passamos às possibilidades de convivência no trabalho em equipe. Respeitar os colegas, sabendo o
limite da “sinceridade”. Grosseria não é, nunca será, sinônimo
de sinceridade, mesmo que o supostamente sincero mantenha a expressão de “mosca
morta”, querendo imprimir ao momento um ar de neutralidade. A sinceridade vem através de sucessivas aberturas de
espaço para que ela aconteça; é preciso sensibilidade aguçada
para chegar a ela; não nasce de hoje para amanhã, E podemos até admitir que nunca nasça. Educação é a chave que abre qualquer porta, principalmente das relações humanas. Algumas vezes a diversidade de
características dos elementos é tão aguda, que torna impossível a
adaptação saudável de alguns. Doentes? Não, diferentes, com
outras histórias de vida, com capacidade de resiliência maior ou
menos, aspectos que podem ser lapidados com a devida<br />
autoprogramação. Porém, não raramente, o indivíduo que
passa por situação crítica sente uma solidão incrível, que não
é fruto do seu imaginário. Ele sente porque realmente é deixado só. Poucos
querem aproximação, por medo de serem envolvidos, independente da
origem da crise. A famigerada resiliência precisa existir para a superação gradativa. Os
elementos do grupo precisam cultivar em si aspectos tais como:
flexibilidade, criatividade, objetivos definidos, consciência dos
limites físicos, observando reações fisiológicas e emocionais,
que, se ignoradas, desencadeiam desconforto, dor e doenças. As relações harmônicas no ambiente de trabalho promovem melhor desempenho. A busca por isso precisa ter inicio no contexto individual. Cada elemento precisa sentir liberdade para cumprir suas tarefas sem constrangimentos. É proposta personalíssima. Evidente que nem tudo se resolve com
resiliência. Ao gestor compete a preocupação pela manutenção de um ambiente harmônico, valorizando os membros da equipe de forma que não sejam alimentadas vaidades, desigualdades e rivalidades. É importante lembrar que há muitos casos de assédio moral no ambiente de
trabalho, oriundos de superior hierárquico ou por parte de colegas, que a resiliência não supera. Temos aí um sério problema de
gestão, ou melhor, de gestor. O assediado no setor privado conta com alguma proteção da legislação trabalhista. O Estado, por esperteza ou
falta de interesse, não recepciona a legislação que poderia dar o
devido basta a isso no setor público. Solução ao alcance de todos:
procurar recurso médico e sair de lá com a receita de um
ansiolítico. Isso fará o servidor em tratamento dormir artificialmente, criará um condicionamento sem resolver a situação, pois a origem do problema persiste.Não raras vezes, isso imprimirá um rótulo nas costas do assediado, como se desequilibrado
fosse. A fragilidade ou reação desmedida de um retira o foco daquele que deu origem ao conflito. Além disso, a solução requerida às esferas hierárquicas superiores esbarra no comodismo, nos interesses particulares e de classe ou em políticas internas, dificultando que se chegue a termo para a situação. Em alguns casos o “passe” do servidor é liberado. Em outros , uma luta é travada l para mantê-lo, porém, sem atentar ao inferno vivido por ele. É o servidor que
precisa de remedinho? Não. É vital para todos um ambiente minimamente estável, harmônico, onde haja a devida valorização com deveres e direitos bem definidos. Gerenciar é obrigação dos designados e remunerados para tal função. Não é título nobiliárquico, requer competência e implica em muito trabalho para que se concretize. É preciso que se dê atenção aos problemas do cotidiano, que são transformados em doenças, paliativamente tratados com remédios, que possuem efeitos colaterais. Remédios não curam a maldade, que sempre faz alguém ser o eleito como bode
expiatório. Bom seria se os laboratórios inventassem uma pílula
mágica que consertasse o desvio de caráter de alguns, a covardia de outros e, quem sabe a falta de competência de outros tantos. As pessoas estão adoecendo. Licenças de
saúde, calmantes e outros medicamentos fazem parte das tentativas para solucionar males oriundos do
ambiente de trabalho frustrante, insalubre, desrespeitoso ou segregador. Não é a saída enriquecer os laboratórios
farmacêuticos, lotar os consultórios médicos e psicológicos.
Precisamos de mudanças na forma de conviver, ser mais seletivos e
corajosos ao estabelecer o limite do que realmente é possível suportar. E a educação, mestra do
respeito, precisa ser colocada em alta cotação.<br />
<br /></div>
<div align="JUSTIFY">
<br /></div>
<div align="JUSTIFY">
<br /></div>
<div align="JUSTIFY">
<br /></div>
<br />
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-19491698073272288012014-11-09T07:34:00.000-08:002014-11-15T12:38:11.678-08:00A beleza nossa de cada dia.<div class="MsoNormal">
<div style="text-align: justify;">
<span lang="PT-BR">Tenho
estado tão bonita ultimamente, de uma beleza impar, que não encontra definição
em padrões. Cada linha que vinca o meu rosto conta histórias, como num livro.
Sabe aquelas medidas de proporção do corpo, angústia de tanta gente? Sei lá!
Isso é problema de outros! O meu foco são as articulações, e com elas converso
silenciosamente a cada dia buscando um mútuo entendimento. É, preciso delas
para prosseguir minha história sem dores, para dar muitos abraços e acolher
meus amores. Viram elas até inspiram rima! O corpo é como um carro, que, se não
parar, nos leva a qualquer lugar, seja velho ou seja novo, seja maior ou menor.
Então a gente deve lavar e perfumar, daí todo mundo vai gostar e querer repetir
aquele abraço cheiroso, transbordante de carinho. Tem coisa mais bonita que
isso? Dentes... preciso deles, muito, seja lá de que material. Sorrir faz parte
da vida, e sorrir muito, e gargalhar até doer a musculatura da barriga. A
alegria é inesquecível, o melhor elixir para a vida, um componente da lindeza
que eu vejo no espelho. Porém, nem tudo na vida são risos, daí vem a parte
séria. Decisões e opiniões, hora de falar, hora de calar. Calar fica mais difícil,
conforme o temperamento. Dizem até que é sinônimo de sabedoria, mas prefiro abrir
o verbo. Já tive muito tempo para o silêncio e “engoli muito sapo”, e, para
mim, atualmente, fico linda ao falar, ao exprimir tantas verdades,
principalmente se o tema é honestidade. Tem uma galera que curte, outra que sobe
no muro e outros tantos que jogam pedras. Fico triste e até choro, mas, no dia
seguinte, lá estou novamente, com a lindeza que mencionei anteriormente. Pois é,
falta de caráter faz enfear o vivente, talvez ele nem se dê conta! Só uma coisa
afirmo:aturar gente “torta”, só depois de morta, pois, em vida, SEMPRE
conflitam comigo! E espero que bem entendam, que não me refiro ao físico, pois
o físico não é a essência que tanto valorizo. E os dias vão passando e, com
sorte, viverei muitos, correndo atrás da beleza, que não pode ser percebida num
simples olhar de esguelha. Sempre há tempo para a bondade, sempre há tempo para
a honestidade e autenticidade. Basta perceber que isso é felicidade, do tipo que
aparece no espelho em qualquer idade e, para tanto, é preciso ter muita coragem
de olhar a si com sinceridade. <o:p></o:p></span></div>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<div style="text-align: justify;">
<span lang="PT-BR">Buenas,
para variar eu só quis dizer. Foi meio longo o devaneio, mas de boa intenção. Nós,
pessoas com muita história e boa formação de caráter, que já sublimamos padrões
estéticos e sociais impostos, muitas vezes sentimos viver num planeta estranho.
Princípios frágeis, falta de compromisso com o bem comum, interesses
particulares priorizados em total falta de respeito aos semelhantes, vaidades exacerbadas,
parecem haver tomado conta do mundo. Não é o tempo de vida que nos difere, mas
sim a história individual. Há muitas cabeças com alvos cabelos que envergonham
pela conduta desonesta, matreira, interesseira, assim como há também jovens,
que poderiam fazer a diferença, perdendo-se nas malhas da desonestidade. Lamentável,
mas não dá para desistir de incentivar os fiéis aos bons valores, sejam pessoas
novas ou velhas. E que o apagar das luzes externas aconteça, sem escurecer a
beleza luminosa que nossos atos conseguiram alcançar. <o:p></o:p></span></div>
</div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-67195953401059340882014-07-27T11:48:00.001-07:002015-05-23T09:28:30.652-07:00Sobre descanso, direito e dever.<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #37404e; font-family: Helvetica, Arial, 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 14.399999618530273px; line-height: 20px;">Descansar ainda é privilégio de poucos. Num mundo em que ainda existe trabalho escravo e trabalho infantil, até o fisiologicamente necessário vira privilégio, quando permitido. Todos os direitos e deveres</span><span class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #37404e; display: inline; font-family: Helvetica, Arial, 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 14.399999618530273px; line-height: 20px;"> deveriam ser exercidos de forma natural, sem polêmicas, sem confrontos. Pagamento JUSTO e trabalho executado com DEDICAÇÀO; BOM SENSO e RESPEITO dos que administram, preocupação com o FIM a que se destina cada serviço, por parte de TODOS. Tudo ensejaria na distribuição equilibrada do esforço, o que infelizmente não ocorre. É preciso a consciência do dever cumprido. Não é o outro fazer o que me caberia, não é a mera permanência no local de trabalho conforme as horas estabelecidas no contrato, muito menos ficar de olhos tapados ao comprar produtos, fruto do trabalho infantil e/ou escravo. Individualmente somos fracos, coletivamente temos força. Descansar conforme temos o direito reconhecido, para recarregar as baterias e remodelar o que estiver ao alcance, por pouco que pareça, será muito, pois o que precisa ser modificado, com prioridade, é a mentalidade no contexto do trabalho. Realizar, aprender a realizar e deixar de ser um obstáculo aos que assim procedem opera milagres. Basta simplesmente ser gente que aplica o potencial positivo que possui. </span></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-24276757102890214572014-04-19T13:00:00.002-07:002015-05-23T09:53:45.880-07:00Plantar para colher o quê?<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #37404e; font-family: 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px;">Acreditei, ao longo dos meus 60 anos, durante os quais tive a preocupação com a verdade e a honestidade, que certamente colheria os resultados do que sempre defendi. Vou dizer agora, para que os amigos saibam, que não ocorre bem assim. No quesito paz interior, consciência tranquila, certamente isso ocorreu. Porém, esperar receber o tratamento conforme a minha postura frente a vida, tem sid</span><span class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #37404e; display: inline; font-family: 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px;">o uma frustração. Respeito é algo que só recebemos daqueles que respeitam a vida e os demais seres, seus semelhantes ou não. Podemos, ou viver agindo sem nos resignarmos com o que é injusto, com o que é socialmente prejudicial, ou focados em nós mesmos e na família, numa constante adaptação ao que prejudica, mas que se acredita não ser da nossa competência(ou incompetência) mudar. Adotando a segunda opção passaremos batido em qualquer meio, sem encontrarmos maiores empecilhos. Já a primeira opção, que certamente ferirá os calos de alguém, implicará em obstáculos que muitas vezes desconheceremos a autoria, por também desconhecermos as associações existentes. Ah!,vida complicada, princípios morais impraticáveis, que são calcados nos seres, e postos em ação possuem o sabor da frustração! Os fatos podem ter diversas interpretações, e mesmo tendenciosas, mas existem elementos que não deixam margem à dúvida. Daí a necessidade de termos sempre fotos, gravações, documentos, eticétera, pois uma versão de fatos precisa ser coroada de provas, num mundo que transforma a vítima em vilão, se esta não for pessoa com associações de interesses. Eis a razão de câmeras, máquinas fotográficas, gravadores, tudo condensado numa coisinha só, para compensar a falta de verdade humana. A palavra não tem mais valor, pois a mentira é praticada como um instrumento de defesa de interesses dos mais escusos, mas importantes para a manutenção da vaidade, do poder e da usura. E não podemos esquecer que Jesus Cristo(referência ao pensador), ao pregar a justiça numa terra de injustiça social, morreu crucificado. Depois virou ser supremo, mas primeiro teve que provar o sumo da maldade de quem tinha o poder e dos que adoravam um espetáculo de horror.É, um comportamento que vem de longa data, diria que contemporâneo do primeiro grupo social na face da Terra. Tiradentes, cujo dia é comemorado hoje, também levou sua amostra do resultado das associações de interesses e do prazer sádico. Então é assim? É. Mas por que não fui preparada para isso? Ora, alguém tem que acreditar na possibilidade de justiça entre os homens! Alguém precisa crer e lutar por ela, para dar continuidade ao sacrifício exemplar. Uns assistem como platéia, outros lamentam e outros aplaudem o massacre. Muito lugar comum, muito repetitivo. Quem duvidar leia sobre a história da humanidade. Depois, em alguns casos de maior destaque, o alvo vira santo, data comemorativa, nome de rua ou qualquer coisa que resgate as consciências pesadas pela inércia frente aos acontecimentos. Mas eu só quis dizer.</span></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-3874614133150426532014-02-08T10:08:00.002-08:002014-07-27T11:52:44.076-07:00Algo podre no reino...<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #37404e; font-family: 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 13.333333015441895px; line-height: 18px;">Um dia percebemos que determinado segmento da vida não possui mais o sentido inicial. Que o que buscamos esvaziou como um balão, talvez inflado unicamente por nosso entusiasmo. E verificamos que, quanto mais tempo investimos naquilo que u</span><span class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #37404e; display: inline; font-family: 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 13.333333015441895px; line-height: 18px;">m dia nos pareceu importante, mais sentimos a sensação de inutilidade. Constatamos que o que nos incomoda, pouco ou nada importa aos demais, como se vivêssemos em um universo paralelo. E nessa constatação percebemos que a grande maioria vive acomodada, embora seja um estado que perceptivelmente machuca lentamente, desgasta e faz fortalecer aspectos negativos da personalidade. Criam-se defesas que deveriam estar adormecidas, se naquele segmento houvesse a valorização do ser em suas melhores características. Assistimos alguns lançarem mão de artifícios menores em detrimento da competência, uma verdadeira escalada à custa dos ombros alheios. Tudo possível de entender como comportamento histórico, mas questionável quanto aos valores morais necessários e, mais ainda, quanto à validade de fazermos parte de algo que não apreciamos. Quando percebemos que até a felicidade alheia é objeto de incômodo para alguns, e que o segmento se move visando desconstruir o grupo, sentimos vontade de gritar -pára que queremos descer! A vida é muito curta para ser de pouca qualidade. E qualidade é sentirmos harmonia tendo consciência de nossos atos. É sermos úteis e bons, deixando de lado a mesquinhez, sendo educados e nunca desenvolvermos o hábito de boicotar aos demais como se isso fosse uma vitória, ao invés de uma vergonha. Estamos no mundo e, querendo ou não, somos um exemplo aos que nos substituirão e aos que educamos. De exemplos negativos todos os contextos estão entulhados. Os que estão no comando deveriam ser exemplares, para deixar o melhor legado, porém, permitem que os vícios de conduta se perpetuem. Ao observarmos com cuidado é possível constatar que as mudanças e a valorização do que é positivo, não ocorrem por decorrência de medo. Nos contextos em que as alianças são estabelecidas priorizando as vantagens pessoais, a última das prioridades é a competência, tornando, assim, muito fácil a derrocada de qualquer dos membros. A dança das cadeiras é rotina e a insegurança reina solta e soberana. Todos sofrem os reflexos do que podemos nomear como desordem interesseira, e até as baratas e os ratos conseguem facilmente juntar cartas nas mangas para usar contra alguém e em benefício próprio. A saída mais usualmente adotada pela maioria é a shakespiriana, em Hamlet: fazer-se de louco para não ver que “há algo de podre no reino da Dinamarca”, que, mesmo aparentemente cômoda, violenta a inteligência e o senso moral de quem os tem. Complicado, real e aviltante, mas eu só quis dizer...</span></div>
Unknownnoreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-61259380961982196292013-04-06T17:19:00.004-07:002015-05-23T09:56:49.776-07:00Palco...para quê?<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Um dia eu pensei que não queria mais voltar. Pensei que todo o meu esforço havia sido em vão. Sentia-me convencida de que era hora de mudar de caminho, procurar outra estrada. Entrei em casa chorando e fui cercada pela energia mais fortalecedora que existe no mundo: o amor do meu marido e dos meus três filhos. Disseram:-Volta, pois quem te subestima é porque não te conhece!</div>
<div style="text-align: justify;">
Voltei. E aprendi que o medo alheio é uma resposta desejada por muitos,e um prazer que não gosto de proporcionar. Desde então, sinto-me permanentemente agasalhada pelas asas de um anjo. É um conforto indescritível, divino, que só me traz fortalecimento para buscar a justiça e oferecer apoio aos que precisam. Percebi que aqueles que oprimem ou maldosamente prejudicam, cedo ou tarde caem ao solo, vítimas de seus próprios sentimentos. Não travo lutas individuais buscando o autobenefício. Luto pelo que acredito ser justo ao grupo. O que é meu está reservado e será sempre conquistado através do esforço, da competência. Não almejo louros, purpurinas ou outras coisas efêmeras. Desejo é ter gente feliz a minha volta, convivendo em clima de harmonia, livre do peso da opressão e da disputa, que, por vezes, são tão mesquinhas que tornam-se risíveis. Algumas pessoas lutam tanto entre si pelo destaque, que sequer percebem que o palco no qual ambicionam subir não passa de uma caixa de fósforos, tão minúsculo o tamanho. Para as formigas, uma caixinha parece um grande espaço. O que dá acesso e, especialmente, a permanência nos grandes palcos da vida é a luz individual, o talento natural para transformar o mundo que nos cerca em um lugar melhor para viver e conviver.E o que mais podemos ambicionar? Porém, a maldita vaidade humana sem os freios do bom senso e, fortalecida pela mesquinhez, arrasa qualquer ambiente.Mas é preciso perseverar, dia após dia, sem deixar-se abater. Não é preciso dizer, basta fazer. E lembro da frase -volta, pois quem te subestima é porque não te conhece!- e volto disposta a tentar. Quem é capaz lê nos meus atos uma clara mensagem de desejo por transformações. Quem não faz a leitura, bem...deixa estar, milagre não é a minha especialidade. Ambiciosa? Sim, talvez mais do que qualquer um. Quero um imenso palco sobre o qual todos possam estar num feliz estado de harmonia e demonstração de seus talentos. Parece demais? Não, é só o caminho da boa e produtiva convivência.Vale para qualquer local. Basta que cada um ligue o seu próprio desconfiômetro e perceba seus excessos. Tenho os pés firmes no solo e percebo que a única forma de encontrarmos qualidade na necessária convivência é investindo na valorização mútua.Não podemos continuar na desenfreada competição e no constante hábito de sabotar uns aos outros, em nome da ambição e do prazer de afligir aos mais frágeis.A vida é muito curta para ser gasta em uma vivência medíocre. E, explorando um pouco mais a linguagem figurada,digo que estou aprendendo a navegar, mas o mar e os peixes são meus velhos conhecidos.Ensina-me a navegar que te contarei sobre os mistérios do mar, e, juntos, faremos uma grande pescaria. Mas eu só quis dizer.</div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-15809762893291436242013-02-25T09:43:00.002-08:002013-02-25T09:45:26.865-08:00Voar é para os pássaros, mas eu também quero.<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<div style="text-align: justify;">
Voar é para os pássaros, mas o homem, louco de inveja e
sedento de adrenalina resolveu arranjar um meio de realizar a proeza. Eu, como
gosto de deslocamentos rápidos, nada posso fazer senão aderir. Mas, cá entre
nós, não espalhem, não consigo ficar confortável dentro daquele trambolho com
asas. Confesso que, se adiantasse, embarcaria vestida com roupa de mergulho
completa, (incluindo cilindro de oxigênio e pés de pato) e paraquedas, pronta
para qualquer eventualidade. Mas, segundo um amigo piloto, não é solução. Resta
desistir da ideia, relutante, muxoxeando como criança e, enfrentar. É que sinto
uma certa insegurança, em vista da distância do solo. Nas alturas as nuvens são
lindas, o relevo distante, tão cheio de altos e baixos, torna-se minúsculo e o
oceano parece uma película brilhante. Tudo parece composto de serenidade, menos
os meus pensamentos, que insistem em questionar o que a falta de opção deveria
vetar por ser inquestionável. Será que o piloto dormiu bem antes do voo? Será
que pilota tão bem quanto eu dirijo? Bah, daí a coisa fica complicada e resolvo
ler, sem sair da mesma linha por dez minutos. Foi mais ou menos assim o meu
retorno do Rio. Voo atrasado sem explicações seguido de um ritual moroso entre
acomodação de sacolinhas, bolsas e distribuição de balinhas. O piloto com voz
sensual comunicou um defeito na ventilação, já sanado, o que foi confirmado
pelo cheiro de óleo ou plástico que começou a exalar junto com o vapor que saia
pelo duto. É incrível como as pessoas fazem cara de paisagem diante de
situações duvidosas! Entendi a razão de não deixarem embarcar com artefatos do
tipo machados, martelos e outros, pois pensei que seria bom ter um deles para
quebrar o vidro e deixar entrar ar de verdade por aquele buraco, que imagina-se
ser uma janela. Depois de muito anda e para na pista, o urubu subiu! Cruzes!
Mais ou menos na metade do percurso, cansada de tanta reza forte, novamente
ouvi o piloto, ou o comissário, dizer para ficarmos sentados com os cintos,
pois estávamos atravessando uma área de turbulência. Eu senti um forte ímpeto
de levantar e gritar-vai à merda e dirige esta porcaria direito, motorista!-mas
evidentemente mantive a cara de paisagem padrão, comum no avião. </div>
</div>
<div class="MsoNormal">
<div style="text-align: justify;">
No final das contas, nem sacudiu muito. Foi só um 1º de Abril
aplicado pelo piloto em pleno mês de fevereiro. Pousamos em Porto Alegre, para
minha alegria, com a destreza de um pelicano, e todos os passageiros com cara
de paisagem. Foi mais ou menos assim, sem contar o duelo entre o comissário e
uma velhinha. Bem, não sou um pássaro, e sofro da inveja original dos humanos querendo
voar também. Deve ser também uma ponta de masoquismo da minha parte, disfarçada
de senso prático, mas que deixo para analisar em outra vida, pois nesta estou
ocupada planejando o próximo voo. Mas eu só quis dizer.<o:p></o:p></div>
</div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-88852178224709584852013-02-08T15:52:00.002-08:002015-05-23T10:00:25.969-07:00O portão do inferno.<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Foi meu primeiro plantão como
policial em dia de carnaval. Até certo horário tudo correu normalmente, apenas podia-se
ver e ouvir os foliões passando em frente a DP, rumo ao local das costumeiras festas.
Uns rindo e conversando, outros já trôpegos, diria já prontos, no estado que
julgavam ser o ideal para “aproveitar” a noite. Homens, mulheres, rapazes,
meninas, alguns, frequentadores da delegacia, outros, nem tanto, enfim, todos
escoando em direção à praia. Ouvia-se muita música ao longe, entremeada pelo
som extremo que partia dos veículos em circulação. Parecia um prenúncio de
guerra. Deus, que saudade da minha casa! Assim permaneceu, como se toda aquela
gente estivesse reunindo-se, acumulando-se, até o limite insustentável.
Madrugada alta ouviu-se o som da campainha sendo tocada insistentemente,
seguido de fortes batidas na grade de ferro, que fechada com um forte cadeado,
impedia o acesso direto à porta da DP( abençoada grade!). Corremos para
verificar o que estava acontecendo, antevendo alguma tragédia do tipo perseguição,
homicídio, estupro, sei lá o que passou em nossas cabeças. Só sei que o prognóstico
não era dos melhores. Ao abrirmos a porta ficamos estarrecidos com a multidão
que forçava o portão tentando abri-lo. De imediato todos começaram a falar aos
gritos, uns tentando sobrepor as vozes dos outros, numa gritaria impossível de
entender. O plantonista, mais experiente que nós, volantes em início de
carreira, gritou com a multidão, tentando colocar ordem e entender o motivo
daquele tumulto. Apesar do ar livre, sentia-se o cheiro do álcool que recendia daquele
conjunto. Cada pessoa parecia ter um motivo diferente para procurar a polícia. Ouvia-se
sobre socos, pontapés, direitos a proteção, carteira que pegaram, um deu em
cima da mulher do outro e uma coletânea de impropérios dirigidos a nós por não
abrirmos o portão para que ingressassem na delegacia. Aquele portão parecia que
nos separava do inferno, de Sodoma e Gomorra, ou algo do gênero. A primeira
coisa que pensei é que o xadrez era pequeno para tantos e éramos somente três
policiais. Fazer o quê com aquele bando de loucos alcoolizados? Percebendo a
falta de possibilidade de continuarem a noite tumultuando na delegacia, o bando
começou a dispersar aos poucos, pois além de não receberem o menor acolhimento
de nossa parte, ouviram que seriam presos por vandalismo. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Poucos restaram, entre eles
aquele que provavelmente incitara o grupo. Gritava o próprio nome com a língua enrolada,
dizendo que podiam prendê-lo e não esclarecia a razão de sua presença. Apenas
repetia o seu suposto nome e gesticulava, sacudia o portão e enfiava os braços
entre as barras de ferro, como se quisesse passar por entre elas. Apoiada nas
grades estava uma mulher com aparente idade de 50 anos, cabelos descoloridos,
maquiagem fortíssima já meio escorrida, com uma sombra azul quase anil
colorindo as pálpebras, e um vestido curtinho, rodado, semelhante ao de colombina.
Perguntei o que desejava. Respondeu que seu companheiro havia sumido. Evidente
que eu quis saber se ela já havia ligado para casa, para verificar se ele não teria
ido embora da festa para dormir. Ela prontamente explicou que não moravam juntos, que se conheceram na festa e depois ele sumira. Ela queria uma
providência da polícia, que fosse realizada uma busca para encontrá-lo. Não
preciso dizer que o nível de álcool no sangue da colombina devia estar altíssimo,
julgando-se pelo cheiro que a envolvia e por suas pálpebras que teimavam em
querer fechar. Não foi muito difícil convencê-la de que era melhor esperar pelo
companheiro perdido em casa. Lentamente e com dificuldade para acertar os
passos a colombina seguiu pela calçada, indo, talvez, para casa, ou em busca do
pierrô sumido ou de um arlequim desgarrado, quem sabe. O portão permaneceu
fechado, impedindo que o inferno invadisse a DP, pois já bastam os momentos em
que isso ocorre, não raras vezes, por necessidade premente. </div>
Unknownnoreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-68291766290420184632013-02-05T21:49:00.000-08:002015-05-23T10:03:39.962-07:00Olhos verdes.<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
<br />
Saímos para cumprir um mandado. A tarde estava abafada e úmida. Chegamos ao casebre, e um homem velho nos atendeu. No interior, numa cama de casal, duas mulheres que dormiam despertaram ao entrarmos. O ar naquele lugar era irrespirável. A distância entre as tábuas do chão permitia ver que logo abaixo havia um solo úmido, de onde exalava cheiro de esgoto. As buscas iniciaram percorrendo os cantos do cubículo destinado à cozinha. Sobre o fogão havia panelas com restos de comida do almoço, fermentando com o calor e atraindo a presença de moscas. O Velho tossia muito, assim como uma das mulheres, segundo eles, em razão de asma. Mais provável uma tuberculose, em vista da desnutrição. Nós, ali, respirando o mesmo ar viciado e saturado pelo mau cheiro. O esgoto da casa corria para uma vala rasa, que transbordara durante as fortes chuvas que caíram na região. Por isso, o terreno ficara coberto por uma fina camada de excrementos fluidificados. Era difícil a revista do local; era nojento mexer em qualquer coisa lá. Em seguida chegaram três crianças, filhos de uma das mulheres. Um dos pequenos começou a chorar, assustado com a nossa presença. A mãe mandou que sentassem em um degrau. Abaixei para conversar com eles, tentar acalmá-los. Deparei com três lindos pares de olhos verdes a me fitar, com a inocência peculiar das crianças, vivam onde viverem. Ali era a casa delas. Sobre o fogão, a comida em fermentação que comeriam. Aquela mãe que tossia era o único porto seguro que conheciam. Estavam brincando na margem do rio, quando alguém avisou que fossem para casa; e para lá correram, sem entender o que acontecia. Passado o susto inicial, logo já estavam à vontade, apesar da nossa presença, encantados com a viatura. Receberam alguma atenção nossa e foram acalmando. Dava para perceber que aquelas crianças haviam tocado o coração de cada um de nós, embora não pudéssemos demonstrar abertamente. Resolvemos ir embora, pois nada havia ali. Porta fria, mas o coração febril, apertado. Da viatura olhei novamente para as três e só pude pensar onde estava Deus. Vida de polícia.... Alguém quer experimentar?</div>
Unknownnoreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-60829938819715679622012-09-02T21:03:00.001-07:002012-09-02T21:03:45.325-07:00Um, dois, três, ladrão!! Brincar de esconde-esconde deu cana boa!!<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Pois foi assim, numa tranquila
tarde de um feriado, num plantãozinho básico. Estávamos na DP, quando tocou o
celular da Volante. Meu parceiro atendeu. Do outro lado da linha a proprietária
de um estabelecimento comercial local, que, durante a madrugada, havia sido
arrombado pela segunda vez na mesma semana. Muito nervosa, pedia ajuda,
relatando estar com serralheiros colocando grades na loja, e haver um sujeito
parado na calçada observando os trabalhos. Relatou que esse trajava uma camisa
idêntica a uma das que haviam sido furtadas da vitrine na madrugada. O colega –
que era cliente da loja – explicou que
não poderíamos agir apenas em função da semelhança entre a camisa furtada e a
usada pelo sujeito; disse que iríamos dar uma circulada e passaríamos na loja.
Ao chegarmos lá, soubemos que o desconhecido já havia saído do local,
acompanhado de outro elemento. A partir da descrição dada pela comerciante,
visualizamos um deles, que se deslocara até um ponto de ônibus, distante uns
200 metros, em uma transversal à rua da loja. Trafegamos lentamente até ele e
resolvemos abordá-lo. A criatura estava na “paz”, sentado em uma pedra, olhos
congestionados e não se alterou diante da nossa chegada. Estava sem identidade
e nos forneceu o nome completo,
endereço, nome da mãe, data de nascimento, num ar de total inocência. Admitiu
ter “fumado um” e que estivera na frente da loja para observar o trabalho dos
serralheiros. Sem termos mais nada para fazer ali, entramos na viatura,
deixando o rapaz no local. Meu parceiro, meio ninja, apenas disse: – Tinha um
cara, do outro lado da rua, que saiu de fininho quando chegamos. Era o outro.
Entrou naquela casa logo ali. Vou te mostrar. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Dei-me conta de que eu tinha fixado
o primeiro sujeito e não tinha visto o segundo. Fiquei irritada comigo, pois
havia “comido mosca” durante a abordagem. Dizem que olhos de japonês são dois
risquinhos, mas, evidentemente, isso não elimina a acuidade visual. Passamos,
então, na tal casa, e lá estava o outro, sentado dentro do pátio. Nada podíamos
fazer. Fiquei frustrada com a situação. Retornamos à loja. Meu colega foi falar
com a proprietária, e eu resolvi
caminhar até a esquina, para visualizar a casa e ver se o sujeito havia saído
para a rua novamente. Como eu queria saber qual era o plano daqueles dois! Na
esquina, espiei, como uma criança brincando de esconde-esconde. Não queria ser
vista pelos dois sujeitos.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Os transeuntes devem ter achado
estranho o meu comportamento, encostada no imóvel da esquina, espiando a rua
transversal. Para minha surpresa, visualizei os dois rapazes juntos no ponto de
ônibus. O malandro havia saído do ferrolho! Voltei correndo para a viatura
chamando o meu dupla. Ele não sabe, mas naquele momento me senti com oito anos
e prestes a gritar: – Um, dois três, ladrão! Bati! – como fazia quando brincava
de esconder. Num piscar de olhos, já estávamos ao lado do segundo sujeito, que
carregava uma mochila e já retornava para a casa onde o havíamos visto
anteriormente. Meu colega pediu que ele parasse para conversarmos. Descemos,
encaminhamos o suspeito para a calçada e pedimos seus documentos. Quando meu
dupla pediu para que ele abrisse o casaco, eis o que apareceu por baixo: dois
outros casacos, iguais em cor e modelo. Não estava tão frio para ele estar
vestido como uma cebola, trajando tantas peças sobrepostas, estranhamente
iguais e com aparência de novíssimas. Pedimos que mostrasse o conteúdo da
mochila. Ao abri-la, vimos que havia várias peças de roupas. Cada peça trazia a
etiqueta com o preço. Gostei do sorriso que brotou no rosto do meu parceiro. Um
misto de satisfação e humor, pois, para nós, chegava a ser engraçado flagrar a
criatura portando tudo aquilo e, ainda mais, em frente à própria residência.
Como havíamos constatado ser menor de
idade, atravessei a rua e fui chamar a mãe dele. Da porta de entrada deu para
ver que a sala era usada como brechó. Acho que o nosso “jovem cliente” estava
querendo entrar para o comércio de roupas, inspirado na atividade comercial da
mãe. O resto da história correu como costuma sempre que o autor é adolescente.
Tudo devidamente registrado em conformidade com a lei, inclusive o relato sobre
a participação do outro envolvido, que, aliás, vendo a cena na rua, desapareceu
do ponto de ônibus quase num passe de mágica. Escafedeu-se! Foi um bom
trabalho, com resposta quase imediata à vítima, que recuperou uma boa parte de
suas mercadorias furtadas. Nós, policiais, pela sensação de dever cumprido,
ganhamos o dia. O largo sorriso juvenil do meu colega, ao comentar os fatos,
evidenciava a satisfação que sentia. E, na minha fisionomia, talvez estivesse
presente a expressão da infância, ao bater alguém antes que chegue ao ferrolho.
Pois é, em meio às agruras do trabalho policial, ainda conseguimos sorrir: ou
por conta da imaginação divertida; ou da operação exitosa, afinal, é muito bom
ser feliz trabalhando. Mas eu só quis dizer, em homenagem ao meu querido amigo
e ex-dupla da Volante, um policial dedicado e ser humano que amo como a um filho.</div>
Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-12196252450435208752012-06-27T19:31:00.001-07:002012-06-29T21:10:16.175-07:00Rebuliço no jardim.<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Em seus vasos no jardim,
preguiçosamente instaladas, <span style="background-color: white;">flores e verdes num silêncio
profundo, como acontece em todo o mundo.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
De repente um grito: - Ela vem
vindo! Vamos fingir que estamos dormindo!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Equipada com tesoura, vassoura,
regador e pá, chega Maricota ao jardim e logo percebe o ar de indiferença
forçada em suas plantinhas amadas. Margaridinha virou seus ramos e flores para
outro lado, fingindo não perceber a chegada da jardineira, sempre tão faceira. Azaleia
fingiu sono, ensaiando um cochilo; enquanto os gerânios cochichavam uns com os
outros, fingindo analisar seus pistilos. Outras plantas, mais tímidas,
assistiam a cena sem qualquer manifestação, contendo a admiração.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Sem rodeios, Maricota foi logo
cumprimentando e em seguida perguntando:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Bom dia, queridas! Estão com
saudades de mim?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A azaleia, majestosa e muito sem
querer se pôs a responder:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Nem pensar! E hoje é domingo,
estamos saindo para o jasmim visitar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Percebendo um certo ar de
ressentimento, dona Maricota tentou convencer:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Mas pensei muito em vocês, em
cuidá-las outra vez. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A flor-de-mel, com um ar
aborrecido esbravejou num tremido:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Não queremos nos arrumar, deixa
o vento estragar!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Tentando uma conciliação,
Maricota deu uma explicação.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Mas é preciso, a primavera vai
chegar! Vocês todas vão gostar!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A malva, muito biliosa, tratou de
retrucar:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Por que tanto interesse? Passavas
e nem nos olhavas! Florescemos a valer para nos olhares outra vez.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Maricota, sempre muito
persistente, a irritada malva acariciou e a todas com simpatia explicou:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Sinto muito, minhas lindas, eu
estava muito cansada, sem tempo pra quase nada.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
O pingo-de-ouro, antevendo seu
destino, berrou como um militar em guerra.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Mas em nós não tocas não, chega
pra lá com esta mão e com este baita tesourão!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A tesoura, muito meiga e
constrangida, tratou de amenizar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Vou cortar só um pouquinho, mas
como se fosse um carinho!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A pá de lixo, costumeiramente
muito metida, resolveu se intrometer. Olhando para a flor–de-mel exclamou a descrever:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Céus como estás escabelada!
Galhos secos e flores misturadas!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Maricota, examinou aos gerânios e
a um deles perguntou: </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- E que bichinhos são estes,
grudados nos teus raminhos?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Com um ar triste a pobre flor do
gerânio explicou.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- É cochonilha branquinha, que me
deixa bem magrinha. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Compadecida, Maricota sentenciou:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Então vamos limpar, para você
hidratar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A vassoura, muito solícita, foi
logo se pronunciando:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Prometo que só vou parar,
quando o jardim embelezar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Maricota ia fazendo a limpeza nos
gerânios, limpando as cochonilhas, que muito a contra gosto, desgrudavam dos
ramos da plantinhas. Enquanto limpava a todas falava:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- São minhas preferidas e sempre
as mais queridas!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A tesoura, com voz levemente
rouca e melosa, pedia licença para cortar os galhos secos das agitadas
plantinhas chorosas. As violetas, muito frágeis e dengosas, logo cederam ao
carinho da tesoura, que afirmava não ser dolorosa.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Se é assim mesmo, deixamos, mas
se doer te avisamos - diziam elas em sua meiguice. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
E a tesoura ia cortando, muito
disposta confortando. Folhas secas e amarelas teriam que sair delas.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Não vai doer não, todas vão
ficar limpinhas e só com as folhas verdinhas.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Ao ver seu vaso arrastado
margaridinha gritou: </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Ai, credo, ela vai me trocar de
lugar, para onde vai me levar!?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A vassoura, muito segura, tratou
de ser categórica.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Calma, margaridinha, só quero
fazer uma limpezinha, o teu vaso está muito sujo, tem até um caramujo.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Azaleia, cheia de indignação,
teve um ataque de tosse. Pediu à Maricota mais consideração</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Cof! Cof! Larga essa vassoura!
Te prefiro com a tesoura!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A pá que era de pouca fala, mas
muito metida, interveio, querendo se meter no meio.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Mas a vassoura ralhou, pois a pá
se engasgou.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Calma, dona azaleia, é preciso
cuidar, para muito limpo ficar! Eu estou gastando as minhas cerdas de tanto
esfregar e você não para de reclamar!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Depois de tanto trabalho, chão
limpo, galhos e folhas secas ensacados, o regador, que até ali era mero
observador, resolveu soltar o verbo e como um mestre de cerimônia anunciou o
encerramento com toda a parcimônia.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Agora para finalizar vou molhar
para hidratar. Para cada menina, água com vitamina! </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Maricota, cheia de orgulho de tão
bom resultado, perguntou ansiosa, olhando para todo lado:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- E agora minhas lindinhas, que tal,
se sentem limpinhas?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Muitas vozes responderam de cada
modo diverso, que se sentiam muito bem, as mais lindas plantas do universo.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Mas eis que um grito de socorro
ecoa do saco plástico, fazendo Maricota,
seus equipamentos e as plantas levar um susto fantástico. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Correndo em direção ao saco,
Maricota olhou para dentro dele e perguntou quem gritava, pois da voz se
admirava. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Somos nós, os galhos e as
folhas secas, quem mais poderia ser? Tiraste a nossa moradia, pensamos que isso
não aconteceria. Vais nos mandar embora, colocando-nos fora?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Maricota sorrindo acalmou o monte
ensacado.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
De jeito nenhum, vocês são
importantes, só não ficarão onde estavam antes. Misturados com minhocas farão
um belo composto, pelo qual as plantas têm muito gosto!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
E assim com todos contentes
encerrou o rebuliço, mas eu só quis dizer isso.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Da criança criativa que
sobreviveu em mim, apesar dos pesares, para as crianças criativas, ainda crianças, apesar dos pesares.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-55236002989319442912012-05-28T21:43:00.003-07:002012-05-28T21:45:47.168-07:00Ponderações<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Arial;">Estou
em processo de despedida da localidade onde iniciei minha jornada como
policial. Dizer adeus aos colegas, aos colegas amigos e aos meus loucos
queridos da cidade, que fizeram parte dos meus plantões, não é fácil. A
sensação de vazio invade a alma, a incerteza aperta a garganta, de onde quase
sai um pedido de –venham comigo! Ah! Como eu gostaria de não ter que mudar,
embora a mudança seja desejada! Contraditório, não? Pois é, mas lá conheci a
realidade policial e um mundo, como muitas vezes já expressei, diferente
daquele de outras fases da minha vida. Lá vivi momentos muito bons, muitos
risos, assim como muitas angústias, que valeram mais que uma disciplina
acadêmica. A sensação de perda ocorre porque essa acontece mesmo. Encerrar um
período dá essa sensação, pois, seja lá como for, há algo deixado, sem que
jamais possa ser resgatado. Não há resgate quando o retorno evidencia grandes
diferenças. Se eu retornar depois de um período, o que encontrarei? Alguns
terão ido, outros terão vindo, e o cenário terá, também, muitas diferenças. E
tampouco seremos iguais. E tudo faz parte da composição da vida; é assim que
acontece. Início e término de fases, sentimentos para serem avaliados e
expectativas quanto à nova fase; cada coisa em seu tempo e lugar. Quanto aos
sentimento, sempre gosto de frisar que o policial é um dos profissionais que
mais disfarça o que sente, guarda seus sentimentos em um canto, mas deles não
consegue fugir na solidão de uma noite insone. E as marcas ficam espalhadas
pelo rosto, acumulando-se, e muitas vezes sendo expressas por uma fala amarga
sobre os eventos da vida. Percebo isso e luto contra, não quero mudar a minha
forma original, não quero que os demais mudem também. Quero ser a acolhida de
quem necessita, quero ter a palavra terna para quem me procura, quero ser
humana como creio que todos devam ser. Mudei muito, não há como negar. Fiz-me
mais firme, mais resistente e mais controlada, mas meu caráter continua
essencialmente o mesmo, e até o meu mau humor matinal continua sendo interrompido
apenas pelo café-da-manhã. Algumas coisas permanecem: são marcas registradas.
Agora novos caminhos se abrem e eu quero percorrê-los, digo seguramente que o
preciso fazer. Sei que mais tarde encontrarei estes mesmos colegas em algum
lugar qualquer, e haverá muita fraternidade no encontro. Sobre isso preciso
abrir parênteses explicativos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Arial;">Trabalhei
muito anos como professora, e os reencontros esporádicos com ex-colegas não
foram de muita fraternidade. Diria que neles havia uma certa frieza, um
distanciamento, salvo naqueles casos em que tivesse ocorrido uma aproximação
maior, ultrapassando o contexto profissional; filhos que conviviam bem, maridos
em clima de camaradagem, convites para jantar reunindo as famílias, eticetera.
Pois bem, entre policiais, há reencontros mais efusivos, salvo alguns casos
pontuais. Ouvindo um colega aqui e lá, percebi que a explicação talvez se funde
no fato de sermos considerados, por muitos, “párias” da sociedade. Somos uma
categoria profissional estigmatizada por atos do passado. As condutas mudaram,
os tempos são outros, mas o estigma permanece. A sociedade recorre a nós de
acordo com a necessidade; mas nos imputa a responsabilidade das mazelas na
segurança. Algumas vezes heróis, algumas vezes algozes, e tantas outras vezes quase
marginais, segundo o entendimento geral. Nos tornamos muito próximos, embora a
família de cada um seja mantida à parte. Creio ser uma forma de apoio e
compreensão “sui generis”. Daí surge a expressão “família Polícia Civil”, num
artifício de indução a crer que não estamos sós. Só polícia entende polícia,
numa estranha relação, que perpassa da competitividade na convivência
diária, à proteção exacerbada em meio ao
tiroteio. Uma relação instigante para estudo em vista da importância no
contexto criado pelos próprios policiais. A Policia Civil que eu conheço é um
bloco único. Independente da lotação somos colegas e solidários. Qualquer
conduta diversa é um desvio. E a origem deste pensamento vincula-se à
existência de uma Academia, de onde saem todos os policiais que lotarão as DPs
do Estado. Desconheço qualquer policial para o qual os tempos de Academia não
tenham sido uma etapa marcante. Piores e melhores momentos de cada um são
narrativas presentes nas conversas entre colegas, independente do tempo decorrido.
É o ponto em comum inicial e, por aí, muito mais haverá. Em cada Delegacia, uma
realidade peculiar, íntima aos que nela trabalham. Há uma riqueza de
experiências em cada um, que o afastamento transforma em perda. Estou perdendo
num lugar e sei que ganharei em outro, pois é sempre assim. Mas eu só quis
dizer.</span></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-50513753635373297042012-05-25T07:11:00.005-07:002013-02-25T11:13:21.827-08:00Lampejo.<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;">Ela estava sentada em sua cadeira preferida, que a fazia balançar suavemente no compasso do tique-taque do relógio. Os cabelos lisos e prateados, presos por um delicado passador. A sua frente a madeira queimava na lareira, trazendo o calor aconchegante ao seu frágil corpo. As rugas, que lhe marcavam toda a face, não escondiam um certo ar maroto e feliz. Entregue às lembranças e à imaginação, percorria caminhos, tal como fizera outrora e imaginava-se em outros ainda por conhecer. O corpo não a levava mais aonde queria ir, mas a imaginação e as lembranças sim. Era ela, a imaginação, seu último contato com o muito ainda por conhecer e fazer. A incoerência biológica, imposta ao seu corpo, a envelhecera; porém esquecera de avisar ao espírito que envelhecesse também. Há muito tempo um amigo, ao ouvir suas narrativas, a havia chamado de espírito jovem. Ela ainda possuía essa característica, fruto de um insaciável amor pela vida. Queria experimentar, conhecer, sem admitir as imposições do tempo; mas este vencera seu corpo e poupara seu espírito, o qual a impulsionava a ter toda a emoção que desejava, sem sair de sua cadeira. Suavemente adormeceu, num cenário muito azul e brilhante...Mas eu só quis dizer.</span></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-30018009159890834522012-03-18T16:50:00.001-07:002012-03-18T16:50:45.285-07:00Retalhos da Adolescência.<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Muitas vezes, tenho lembrado de
minha adolescência, de amigos e de colegas com os quais convivi e até
reencontrei depois de muitos anos. Ainda recordo de características de alguns
deles e de momentos de convivência com acontecimentos marcantes. É bem verdade
que, naquela fase, eu não tinha tempo para analisar muito; estava mais focada
em tirar boas notas no colégio, para não
ser xingada em casa, e em cuidar do coração, sempre apaixonado. E quantas
paixões! Pouco duradouras, bem verdade, mas que faziam a vida ser colorida e
repleta de borboletas. A vida social acontecia toda em função do colégio, pois
naquele tempo, ocorriam bailes e reuniões dançantes, organizadas pelo grêmio
estudantil e pela direção da escola. Todas as atividades esportivas e
comemorativas desfechavam num acontecimento dançante. Nas vésperas da festa,
quase deslizávamos pelos corredores do colégio, tal a euforia com o
acontecimento que se aproximava. O coração ficava aos pulos, só em pensar se os
nossos alvos de afeto nos tirariam para dançar na festa. Tudo meio platônico e,
como tal, idealizado, o que resultava numa grande emoção ou numa decepção. As
mães acompanhavam as filhas e ficavam reunidas na mesma mesa, para conversar e
vigiar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
No dia de aula seguinte, após o
evento, passávamos cochichando com as melhores amigas em plena sala de aula. Olhares
sonhadores ou até olhos inchados, pelo choro triste da desilusão amorosa,
faziam parte do momento. Fofoquinhas sobre esta ou aquela colega também
compunham o contexto. Mas parecia ser tudo muito dinâmico, e o momento logo ficava
para trás, assim como os amores tão devastadores, quanto efêmeros. Mudei de
escola para cursar o científico (assim era a denominação na época). Fui para o
Colégio Júlio de Castilhos. Confesso que queria muito esta mudança. Mesmo podendo
chocar os ex-colegas do Cruzeiro, digo que já estava saturada daquela mesmice,
queria mudar de escola, conhecer novas pessoas. A vida na minha casa era um
verdadeiro tédio. E eu, talvez por isso, adorava mudanças. Mudei e gostei mais
do que poderia imaginar nos meus delírios adolescentes. Lá eu não era nem
filha, nem irmã de alguém, como havia sido até então; era simplesmente uma
aluna. Meu rito de passagem para uma adolescência com vistas ao amadurecimento
ocorreu ali. Conquistei a minha individualidade, meio perdida e meio
deslumbrada. Estudar no Julinho em tempos de ditadura militar tinha o seu
glamour, fazia com que me sentisse uma rebelde, sem causa obviamente, mas,
ainda assim, rebelde. Cá entre nós, política não era o meu forte. Aliás, acho
que o de ninguém, em vista do grande tabu criado pelo governo militar.
Protestos contra o uso obrigatório do uniforme foram o máximo de ativismo que
pudemos experimentar. Foi assunto, durante muitos dias, a cena dantesca dos Pedro
e Paulo (assim eram chamados) saltando de seus veículos com cassetetes nas
mãos, para se pôr em perseguição aos alunos que se negavam a entrar na escola.
Meninos e menina,s entre 14 e 18 anos, fugindo aos gritos, em seus rejeitados
uniformes amarelo-ouro e marrom. Apesar do absurdo, aquilo tudo nos rendeu
lembranças e conversas emocionadas. Lembro do diretor do turno da tarde, horário
em que acontecera o protesto, em estado de desespero pelo episódio. Jurava não
haver chamado o policiamento. Recolhidos ao interior do colégio, ficamos por um
longo tempo olhando, através dos vidros, os policiais, enfileirados, cobrindo
toda a frente do prédio, como a transmitir a mensagem “saiam e verão o que lhes
acontece”. Não saímos, lógico! Depois de um tempo, fomos para as respectivas
salas de aula. O colégio, que tinha fama de ser reduto de alunos comunistas, nem
grêmio estudantil possuía mais; somente tinha por alunos uma legião de adolescentes
rebeldes, em busca de um pouco de aventura, tal como há em todos os tempos. E
ríamos, e brincávamos, e namorávamos de uma forma tão leve, que passaríamos por
retardados aos olhos dos adolescentes de hoje.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
O bairro onde morava deixou de
ter o significado de vida social para mim. Passou a ser somente onde estava
localizada a minha casa. A família, extremamente conservadora, era um ponto de
referência, e eu a sentia, muitas vezes, como um serviço de carceragem. Era o
que me mantinha dentro dos padrões convencionais. Mas digo, com toda a
sinceridade, que o que eu queria naquele tempo era ganhar o mundo, ser livre,
embora nem saiba explicar o que entendia por liberdade. Eu queria poder pensar
diferente e até este direito me era tirado. Cedo descobri que pensar e não
expor meus pensamentos era a melhor forma de preservar a minha liberdade de ser
e sentir. Não conseguia pensar como queriam que eu pensasse e, por esta razão,
era constante alvo de recriminações em casa. Até hoje me questiono sobre os
motivos. Aprendi a mostrar de mim apenas aquilo que sabia não provocar
conflitos. Foi a forma que encontrei de preservar a minha alegria e individualidade,
e de ter um mundo no qual as minhas idéias sobrevivessem. Dele os contrários
eram merecidamente excluídos. Era como ter vida dupla. Uma em família e outra
no mundo, longe dela. E, do meu jeito, consegui sobreviver ao afogamento pelas
lágrimas de adolescente, em fuga da total falta de um diálogo familiar franco.
Criei minhas asas gradativamente. Aonde elas me levaram? À conquista de ser,
dizer, chorar e rir, sem interrupções de comando. Alguns devem se pôr a
imaginar que criatura difícil fui. Podem esquecer. Acredito que a austeridade
daquele tempo, quando alguns pais reinavam absolutos em seus lares,
transformasse em problema o filho que tivesse alguma personalidade. Respeito
era o chamado acatamento das vontades paternas. Mas, na minha casa, a rigidez
era visivelmente maior do que na casa das minhas colegas. Espontaneidade era
sinônimo de falta de trato social, falta de juízo e de tantas outras coisas
consideradas inadequadas na minha família.
Muitas vezes, reflito sobre o quanto a repressão emocional deixa marcas
em nossas vidas, levando até ao desespero, se a inteligência não apontar um caminho
alternativo que permita o desabrochar da personalidade. Com o tempo, já tendo
constituído minha família, passei a dialogar mais francamente com meus pais. Eu
não dependia deles, e o perceptível medo da solidão os fez ficarem mais
contidos no quesito austeridade. Mas a minha adolescência já havia ido embora,
sem uma vez sequer ter sentido ser algo mais que uma preocupação. Não dói mais.
Mas eu só quis dizer.</div>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-81395883016846980442012-02-29T19:05:00.001-08:002012-02-29T19:05:12.755-08:00Acústica<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Quando comecei a trabalhar na
polícia, o chefe do plantão, policial experiente no registro de ocorrências,
foi encarregado de treinar os novatos. Eu ficava fazendo os registros, enquanto
o colega orientava. Numa das noites, entrou um velhinho do tipo desgastadíssimo,
que, se dirigindo a mim, expôs que queria fazer um registro. Não me lembro do
fato que o levou até a DP. Pedi sua identidade, ao que ele não atendeu. Repeti
o pedido enquanto ele me olhava fixamente. Vendo os movimentos de lábios,
explicou que quase não podia me ouvir. Daí teve início um verdadeiro show
acústico no interior do plantão:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-O SENHOR TEM AÍ SUA IDENTIDADE?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Ah, a senhora quer a minha
identidade?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-SIM, PODE ME PASSAR SUA
IDENTIDADE?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Entendi. Não tenho.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-ENTÃO ME DIGA O SEU NOME COMPLETO.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-QUAL A SUA DATA DE NASCIMENTO?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Digitados os dados, o sistema
apontou um indivíduo que possivelmente seria o velhinho surdo. Para confirmar,
perguntei:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-QUAL O NOME DA SUA MÃE?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Argelina.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-O NOME DA SUA MÃE É ALGELINDA?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Com um meio sorriso, ele respondeu:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-É, Argelina.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Eu, principiante e preocupada em
não fazer registro errado, parti para o nome do pai do velhinho.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- O NOME DO SEU PAI É PEDRO? -
Dando graças a Deus do progenitor ter um nome comum.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Meio inseguro, confirmou.
Imaginei que o senhor Pedro devia ter ido desta para outra há um século, fato
que quase o apagara da memória do filho. Resolvi refrescar-lhe a memória.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-O NOME DO SEU PAI É PEDRO E O DA
SUA MÃE É ALGELINDA!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
O velhinho estampou um meio
sorriso e tornou a falar:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- É, Argelina.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Eu ia repetir o nome da mãe
novamente, quando fui interrompida pelo plantonista, que, já impaciente,
estivera o tempo inteiro ali, naquele plantão do tamanho de um ovo, assistindo
a cena e ouvindo o meu exercício vocal. Apressado falou:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Toca, toca pra frente o registro
que é ele mesmo!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Irritada por estar sendo apurada
por ele, virei e falei indignada no mesmo tom em que falara com o velhinho:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-MAS EU NÃO POSSO DEIXAR ELE
MORRER SEM SABER DIZER O NOME DA MÃE DELE!!!!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Dei-me conta de que minha voz
ecoara, e que até o velhinho surdo ouvira a exclamação. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
O momento seguinte foi de
silêncio absoluto, logo seguido da risada do plantonista.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Não saberia descrever o tamanho
do meu constrangimento. Coisa de principiante, mas eu só quis dizer.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-14934515463062179322012-02-02T10:52:00.000-08:002014-07-27T11:56:22.789-07:00Resgatando o afeto<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Entrei e olhei os rostos,
procurando algum que me fosse familiar. Escolhi uma mesa de onde eu pudesse
observar a porta. Lentamente puxei a cadeira, sentei e, de imediato, comecei a
remexer no conteúdo da minha bolsa, buscando, naquele mar caótico, uma caneta.
Se tivesse que esperar, precisaria me ocupar, quem sabe, escrevendo algumas
linhas, para aproveitá-las em um texto novo. Nada de caneta, incrível! Desisti
e comecei a olhar o cardápio que o garçom trouxera na minha chegada. As gurias
logo chegariam! E o Claudio, será que viria também? Eu estava ali, inquieta
como uma adolescente. Na verdade, naquele momento, eu era uma adolescente, pois
meus pensamentos estavam voltados aos meus treze ou quatorze anos – tempo de
ginásio. Sempre fico assim quando vou ao encontro dos colegas da adolescência.
É como se abrisse uma janela no tempo e esta me permitisse retomar a leveza da
juventude. Entrava um, entrava outro e nada de aparecerem. Olhei as horas e
constatei estar havia cinco minutos ali. Mas que cinco minutos longos!
Novamente, a porta se abriu e vi o Claudio. Um misto de alegria e serenidade
tomou conta de mim. Quarenta anos se passaram desde a última vez em que nos
vimos. Como explicar a insignificância desse tempo, em relação aos cinco
minutos anteriormente esperados? Senti a alegria do reencontro, e a sensação de
que há pouco estávamos sentados no muro do colégio, conversando durante o
recreio. O reencontro desfez o espaço temporal, trazendo aquele sentimento de
amizade e proximidade. Saudade? Acho que é só uma palavra que usamos por não sabermos
expressar o que realmente sentimos. Penso ser familiaridade, quando nos
sentimos tão próximos e à vontade, num reencontro após quarenta anos. O abraço,
caloroso, cheio de “Claudio”. É, sempre foi assim, muito Claudio, como só ele
sabia ser, e percebo que ainda sabe. Sentados frente-a-frente, comecei a falar,
numa urgência de contar as últimas novidades da minha vida, como se ele soubesse
alguma coisa dela. Como se houvéssemos conversado no dia anterior. Sobre a
expressão “falar pelos cotovelos”, fui à exemplificação na medida exata. Tinha
tanto para dizer, que realmente precisaria de cotovelos falantes. Mudamos em
muitos aspectos. Vivemos nossas vidas na mesma cidade, sem um dia sequer termos
nos encontrado. Cada um cuidando da própria vida, dos seus amores e seguindo
sua caminhada. Envelhecemos, evidentemente. As indisfarçáveis marcas do tempo
estavam presentes nos nossos rostos, mas ainda éramos nós, Claudio e Silvia,
sentados no muro do colégio, rindo e conversando; ele, mais a observar. Esses
momentos me fazem sentir como a vida é boa. Pequenas frações de tempo renovam,
pela alegria que proporcionam. Minha tagarelice foi interrompida pela chegada
da Lea e da Jeanne. Como não ficar feliz naquele momento? Posso dizer que
estarmos ali era um presente. O meu dia havia sido difícil, com frustrações
relacionadas ao trabalho, as quais ficaram esquecidas. A Jeanne, que fazia
muito não via o Claudio, passou de imediato a indagá-lo, alegando que tinha que
aproveitar a oportunidade para se atualizar sobre a vida dele, saber dos
filhos, casamento, eticétera, eticétera. Foi divertido assistir! A Lea já estava
mais inteirada, pois sempre manteve contato ao longo dos anos. Mas o Claudio tinha
um compromisso e precisava ir embora. Nos despedimos, então. Lamentei, mas não
fiquei triste. Ele iria se ausentar da minha vida por um espaço de tempo
indeterminado, porém, insignificante a partir do momento em que nos
reencontrássemos, tal como ocorrera com os quarenta anos. Percebi que, em qualquer
tempo, ele continuaria sendo muito “Claudio”. Ele estava bem, isso é o que
importava. Sozinhas, eu, Jeanne e Lea recomeçamos nossa conversa, que ainda se
estendeu por algumas horas, insuficientes para tanto o que falar. Combinamos
novo encontro para breve. Levantamos e lentamente saímos pela porta, como
meninas com saias de preguinhas em tempo de colégio; a alma renovada pela
certeza da vitória no desafio do tempo. No caminho para casa, pensei muito
neles e no quanto vê-los me fizera bem. Realmente não é saudade. É uma retomada
do afeto, sem resgate do passado; simplesmente assim. Somos o que somos no
presente, e do passado só queremos o afeto que
não se extinguiu; se renova a cada encontro. Antes que o tempo me vença
é melhor comunicar: - Claudio, Jeanne e Lea, que bom que estão na minha vida!
Amo vocês! Mas eu só quis dizer.</div>
Unknownnoreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-63228311752525214202012-01-20T20:39:00.000-08:002012-01-20T20:39:10.864-08:00Marcas no olhar.<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Mais de um ano de trabalho e,
conseqüentemente, muitos plantões. O que mudou?
Em mim, muitas mudanças. Definitivamente não sou a mesma de um ano
atrás. Esse, no entanto, não é um comentário sobre o óbvio, pois me refiro a uma
transformação, talvez, sutil à percepção de alguns; mas exacerbada ao meu
sentir. Certa vez, uma amiga expressou a ideia de que, segundo o seu
entendimento, o policial deveria ter o olhar sereno de um guarda florestal, tal
como o meu. Achei graça e agradeci pelo estranho elogio. Não obstante a graça, suas
palavras foram extremamente marcantes, pois freqüentemente as relembro. Observo
atentamente os olhares que me cercam. Na DP, raros são os que transmitem esta
serenidade. Sei que o meu olhar mudou, e agora reflete uma realidade vivenciada
que, há um ano atrás, para mim, pertencia ao contexto distante que circula nos
jornais e na televisão. Há uma realidade que todos sabemos existir, mas que só
esporadicamente nos toca. Dela somos reféns e talvez por isso procuramos vê-la
como típica de um outro mundo, mundo esse que tememos como crianças temem o
“bicho papão”. Creio ser um mecanismo de defesa da nossa paz interior. Pois
bem, o meu trabalho me coloca exatamente em meio ao que a maioria gostaria de
ignorar. No mundo de “Alice no país das maravilhas”, onde tudo é cor e
descobertas, o olhar serena. Na realidade de uma DP, nada é cor.
Inexoravelmente encontramos o pior que o ser humano carrega em si, num desfile
contínuo de agressividades, vilanias, desonestidades. São condutas que imprimem
a desconfiança no olhar daqueles que, por decorrência do trabalho, contatam
freqüentemente com elas. É difícil saber quem mente quando as partes presentes
a nossa frente afirmam veementemente dizer a verdade. Aprender a não ter, nem
demonstrar, empatia é um exercício necessário. Por vezes, propositalmente,
procuramos criar um certo ar de empatia, pois, como estratégia, rende
informações valiosas à eficiência do trabalho. Tudo isso faz de nós, policiais,
profissionais especializados numa lida
nefasta, que deixa marcas no nosso olhar e na nossa expressão facial... É comum
a atividade profissional deixar certas características em quem a exerce. Fui
professora por um bom tempo e muitas vezes me flagro tendo preocupações que são
consideradas estranhas no meu atual ambiente de trabalho. Uma mesinha com
brinquedos para distrair crianças que acompanham os pais até a delegacia está
lá. Não as quero em meio à bagunça que os pais promovem. Delegacia não é lugar
de criança, mas os pais se agridem e elas vão junto, devido à falta de quem as
fique cuidando em casa. Não raras vezes os PMs chegam à DP conduzindo o marido
algemado e a mãe espancada. Esta, carregando um filho nos braços e um outro
pela mão. Manter o controle diante do triste quadro é tarefa difícil. E o que
pensar e fazer frente à fragilidade e o trauma das criancinhas reféns de uma
família completamente desestruturada? Não há muita opção para aquele curto
espaço de tempo tomado pelo registro da ocorrência. A mesinha com papéis e
lápis de cor é um breve alento. As crianças ficam divididas entre brincar e
permanecer junto da mãe. E a professora que ainda habita em mim procura, sem
encontrar, uma solução aceitável para a situação. Os meus olhos passam a
refletir descrença; descrença no mundo, na sorte, nos direitos individuais e em
tantas outras possibilidades que são negadas aos gerados sem pedir. Um ano é
uma vida de aprendizado. É tempo para conhecer o que não precisava existir. Mas
eu só quis dizer. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-39838374372140074722012-01-08T18:48:00.001-08:002012-01-08T18:48:51.865-08:00A apoteose sexual do velhinho.<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Do portão, eu o vi caminhando em
minha direção. O corpo franzino, numa postura a indicar cansaço, combinando com
os passos miúdos e inseguros. Era uma figura acabada, estampando o maltrato que
a vida dura imprimiu. Chegou até mim, tirou o chapéu num gesto de cumprimento
hesitante. Sorri e perguntei se podia ajudá-lo. Pobre velhinho, pensei, deve
estar com problemas. Em razão disso, mostrei o meu melhor sorriso, pensando em
deixá-lo mais confiante para expor seu problema. Ele não esboçou qualquer
intenção de entrar na DP. Disse apenas que precisava de uma orientação e de
imediato iniciou seu relato.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Contou que a mulher sempre fora
muito maledicente e que era assim com todos. Que não moravam mais juntos, por ela
não querê-lo perto, mas que já gastara o dinheiro todo da poupança e o da venda
de um terreno para sustentá-la, e que esta, atualmente, morava com uma das
filhas. Lamentou-se pelo fato de sua mulher estar matando a filha e o genro que
cuidavam dela. Relatou que os outros filhos não queriam proximidade com a mãe,
pois esta passava todo o tempo praguejando os que estavam próximos. Fiquei
extremamente compadecida com o lamento daquele velhinho, que me parecia estar
ao final da vida e merecia mais serenidade. Ponderei a ele que o comportamento
de difícil lida devia ser em decorrência de insanidade senil, possível de se
manifestar em idade avançada. No entanto ele, de pronto, exclamou que ela
sempre fora assim. E ainda acrescentou:- Antes, pelo menos era mais “leviana” (leve).
Agora, depois do AVC, ela engordou. Toma quatro cafés com leite, só na parte da
tarde, com pão e o que mais tiver!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Naquele momento, acho que
arregalei os olhos, embora quisesse manter a fleuma. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Disse ele numa fala incontida: - A
senhora imagina que ela antes tinha uns noventa quilos e, agora, deve estar com
uns cento e trinta. E como não consegue levantar para ir ao banheiro, faz tudo
nas fraldas. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Nessa altura do campeonato, eu já
passava as mãos na cabeça, num gesto nervoso, pensando numa saída para aquela
situação. Entendi a razão de filha e genro estarem “caindo pelas tabelas”
frente a um trabalho tão exaustivo; mas percebi uma expressão estranha no olhar
do homem; um misto de rancor em relação a sua mulher. Perguntei a idade dele,
ao que me informou ter 80 anos. Expliquei que ele deveria procurar o serviço de
assistência social da prefeitura, para arranjar uma clínica geriátrica,
poupando, assim, sua filha e genro de uma tarefa tão árdua. Mas ele queria
falar mais. De dentro da sala do plantão, sem que eu houvesse percebido, dois
colegas assistiam e ouviam atentamente a conversa, num silêncio divertido. E o
velhinho prosseguiu:- Ela sempre foi muito ciumenta e nunca me deixava
aproximar de uma mulher assim – fazendo um gesto com a mão em minha direção,
como para indicar a distância que havia entre nós. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Me separei dela e nunca
fui..... – Deu, então, uma risadinha marota, franzindo ainda mais a face
enrugada.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Neste momento eu concluí que a
conversa precisava encerrar. Já estávamos entrando no foro íntimo da vida dele.
Ele insistia em repetir que nunca tinha “ido”, impedido por sua fidelidade,
forçada, a uma mulher ciumenta de noventa quilos, contra os seus prováveis sessenta. Finalmente, a fala
dele atingiu entusiasticamente a narrativa que me pareceu apoteótica.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Pois a senhora sabe, que outro
dia, depois de tanto tempo, eu fui e fiz!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Aquilo foi demais. Aquela
criatura que caminhava precariamente, externava grande euforia para contar que
“fez”?!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Me poupe, por favor! – pensei.
Assistir aquele homem tísico, aos 80 anos, externar seu lado de lobo, deixou-me
perplexa. Para encerrar a conversa,
reforcei a orientação sobre o serviço social e aleguei ter um trabalho para
executar. Ele agradeceu o atendimento e se pôs em lenta caminhada, recolocando
o chapéu na cabeça. Ao fazer meia volta para entrar na sala do plantão, deparei
com os dois colegas rindo. Um disse: -Atendeu o velhinho... Ele gosta de sexo,
não é? Surpresa, perguntei se eles haviam ouvido a nossa conversa. Rindo, o
colega respondeu que sim, mas que já sabia das aventuras dele, pois há alguns
dias o ancião estivera na DP com a mesma conversa sobre sua apoteose sexual. As
amarguras de sua vida eram, na verdade, uma forma introdutória para a narrar
seu feito sexual, aliás, um grande evento.
Mas eu só quis dizer. </div>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-739194862922076932012-01-05T12:12:00.001-08:002012-01-05T12:13:55.096-08:00Bom dia, loucura!<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Manhã com um friozinho gostoso de
beira de rio. Depois de um dia agitado e de uma noite tranqüila, aproxima-se a
hora de encerrar o plantão. O que conclui o despertar é o café da manhã na
padaria bem próxima à DP. A refeição da manhã tem a finalidade fundamental de
me extrair do estado de catatonia em que levanto. Depois de dormir sobre um
colchão que parece uma massa, levanto toda doída e deixo meu formato gravado
nele. A saída é alongar e correr para a padaria. Viva o pão de queijo! Viva a
cueca virada!Viva o café com leite! Incrível! Uma alegria gastronômica na vida
da magrela! No curto trajeto, encontros e diálogos habituais:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Bom dia, alemoa!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Bom dia, querida! Tô indo pra
casa. Vô compá pon. Olha o meu cachorro, esse é meu, meu cachorro!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Acho que durante a noite fez
amizade com um cachorro de rua e este passou a seguí-la. Mas nem um cachorro
agüentaria acompanhá-la em suas caminhadas pela cidade.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Legal, alemoa, muito bonito o
teu cachorro. Tchau, alemoa!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Sigo meu caminho e a deixo
falando alguma coisa ininteligível. Ela passa o dia inteiro caminhando pela
cidade, mas anuncia estar fazendo faxina. Ninguém imagina quando dorme. Algumas
vezes pergunta se ônibus já passou, mas nunca a vi subir nele. Caminho mais um
pouco e já visualizo o ciclista. Este me abana falando alguma coisa que nunca
consigo entender. Na mão, uma latinha de refri, que dizem ser um disfarce para
a cachaça. Mas, cachaça, cedo da manhã? Sua fala parece vir do interior de uma
cumbuca. Tem um som muito estranho. Conversa sozinho todo o tempo. Parece um
rádio ligado. Dizem que uma roda acertou a cabeça dele em cheio, o que o deixou
mais sequelado do que já era. Entro na padaria, cumprimento os conhecidos e
peço o meu café. Sento em uma mesa próxima à vitrine. É bom observar as pessoas
que passam em direção ao trabalho, ou que vão até a praia, para atravessar o
rio na barquinha que faz o vai-e-vem de pessoas entre as cidades. Próximo a
minha mesa está Adão. Olho para ele e com um “bom dia”, introduzo uma conversa.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- E aí, Adão, tomando o café para
começar ou encerrar o dia?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
No seu traje de vigilante,
pistola de plástico em um coldre surrado, postura estudada para transmitir
cansaço, ele responde:</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Tô saindo, tava de plantão. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Naquele momento, ele “está” um
vigilante; mas, outras vezes, usa terno e passa a ser delegado. As pessoas
costumam dar-lhe uniformes e ele muda de profissão conforme a roupa que veste.
Há vários personagens em Adão. De correspondente internacional a agente
penitenciário. Mas ele adora polícia. Já disse que dará um curso de técnicas
operacionais para nós, da DP. Alguém deve ter falado no assunto e ele
memorizou. Contaram que fez até demonstrações em frente à Delegacia. Outro dia
mostrou os finos braços dizendo que está malhando na academia.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
- Tô fortão! Puxando ferro!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Mostrei-me impressionada, e ele
ficou visivelmente envaidecido.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Meu café é servido e inicio o
gostoso delírio matinal. Dá uma alegria enorme estar ali, naquela pequena
cidade, tomando aquele café delicioso e cercada por meus loucos. Talvez eu
também seja um deles. De que tipo, não sei, mas certamente sou louca por café
com leite, pão de queijo e cueca virada. Então, só o que há para dizer é: </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
-Bom dia, loucura!! Isso tudo me faz muito
feliz! Mas eu só quis dizer.</div>Unknownnoreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-64801436028828715522011-12-28T16:10:00.001-08:002016-01-23T11:11:36.061-08:00O Romeu drogado ou Vera querida, eu chi amo! Parte 2<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Subitamente entra no plantão Vera
querida, acompanhada por dois brigadianos que conduziam o Romeu drogado.
Inconformado, este exclamava seu amor pela cabeleireira, tal como acontecera
alguns dias antes. Um único pensamento passou por minha cabeça: -De novo!!! A
violação das medidas protetivas levou o casal até nós, num curto espaço de
tempo. Os colegas da BM explicaram brevemente o que havia ocorrido. Sendo hora
do almoço, o plantonista dera uma rápida saída, aliás, como os demais da DP.
Apenas eu, um colega da Volante e Deus estávamos no prédio. Eu dizia tantos “ai
meu Deus”, que, suponho, Ele desceu do céu para o plantão. Os PMs foram chamados para outra ocorrência, saíram para retornar mais tarde. A cabeleireira foi em busca de algum alimento. Ali permanecemos
com o Romeu choroso, que imediatamente anunciou que poria fim a própria vida. Deixamos que fizesse sua cena, apenas observando o protagonista, até ele
começar a bater com a cabeça na parede. Meu
colega tentou fazê-lo parar, advertindo-o sobre os ferimentos, eticetera,
eticetera, e nada, a gritaria continuou, acompanhada das cabeçadas. A
possibilidade do sujeito ficar com lesões nos deixou preocupados. Sabíamos da
nossa responsabilidade pela integridade física do preso. Preocupava-nos a possibilidade do preso adquirir lesões sob a nossa custódia e, também, por estarmos os dois
em estágio probatório. Bateu a insegurança. As pessoas passavam na calçada e
espiavam pelas janelas da delegacia. Os gritos aguçavam a curiosidade dos
passantes. Meu colega pediu que eu segurasse o Romeu, enquanto telefonava solicitando
o retorno da PM. Cruzei as mãos atrás do pescoço do homem autolesivo e passei a
puxá-lo para frente, para impedir que sua cabeça batesse na parede. Da janela, as pessoas me viam puxar a criatura em minha direção e ele
a gritar. Eu suava muito com o esforço e estava bastante tensa por participar
daquela cena, no mínimo, estranha. Não podíamos pedir ajuda aos transeuntes!
Ficaria na história da pequena cidade o pedido de socorro da polícia aos
cidadãos. Comecei a ficar preocupada com o ridículo da situação; a platéia, que
agora era minha e dele, poderia interpretar que eu assediava o preso, e que ele
gritava por não aceitar o assédio. Finalmente meu colega terminou os telefonema. Pude, então, interromper aquela ridicularia. Busquei algo para amortecer as cabeçadas. Abençoado Código Penal! Funcionou, graças ao bom Deus! O
plantonista retornou, para nosso alívio, e junto chegaram os PMs, fato que
modificou a conduta do Romeu tornando-se muito calmo. Hoje, ao lembrar o episódio, percebo que a minha
inexperiência, assim como a do colega, certamente deram asas ao abuso de
paciência por parte daquela criatura, que encenou o tempo inteiro, deixando-nos
em estado total de exaustão. Iniciado o registro da ocorrência, ficamos sabendo
que nosso preso escandaloso tinha um histórico de muitas confusões, não
trabalhava e vivia às custas da cabeleireira viúva. Dela provinha o dinheiro
para as drogas. Estava com 29 anos de idade, e Vera querida com 53. Pelo que
pude apurar, ela recebia uma pensão em razão da viuvez. Pode parecer pouco, mas
é comum, em grupos menos favorecidos, uma mãe que recebe bolsa família por dois
ou três filhos virar alvo de parasitas de tipos como o Romeu. Pois é, o nosso “herói”
tinha razões para espernear. A perda da galinha dos ovos de ouro, certamente, o
deixava muito preocupado. Vera querida agora se comportava como uma mãe
austera, ameaçando abandoná-lo, sem dinheiro para suas “pedrinhas”. Pensam que
terminou por aí? Não! Apesar das afirmativas contrárias, a cabeleireira voltou
ao convívio de seu amado que, embora fosse um estorvo, a fazia sentir-se invejada
em razão de ser um companheiro tão jovem. Soubemos da reconciliação quando, duas semanas
mais tarde, ela retornou à delegacia acompanhada do irmão, da cunhada e de uma
sobrinha, os quatro se dizendo ameaçados de morte pelo Romeu drogado. Ela
evitava olhar em minha direção. Dava para perceber que Vera querida sabia haver
esgotado a cota de paciência de todos os presentes, particularmente, a minha,
uma vez que eu já me expressara de forma bastante clara sobre aquele circo que
o casal formava com seus desentendimentos. O abençoado celular da Volante tocou chamando
para um trabalho externo, o que teve o valor de um presente para mim. Pensei:
-Adeus, Vera querida! De preferência, até nunca mais!!! Mas eu só quis dizer. </div>
Unknownnoreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-53042885540778474462011-12-23T23:57:00.000-08:002016-01-05T17:56:37.577-08:00O Romeu drogado ou Vera querida, eu “chi” amo! Parte 1<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Como já havia ocorrido em outras ocasiões, ela entrou na DP
para ser protegida do atual companheiro. Eu ignorava a habitualidade das brigas
travadas pelo casal. Estava iniciando minha carreira policial e, conseqüentemente,
ansiosa por ação. As queixas da mulher me deixaram indignada. Pobre mulher! pensava eu. O companheiro era
usuário de drogas, facão, ameaças, e ela estava impossibilitada de buscar suas
roupas na casa que, até aquele momento, havia sido seu lar. Relatou que tinha medo, enfim,
mil mazelas, mas sem lágrimas. Na ocasião trabalhavam dois delegados
na DP, ambos recém formados e igualmente ávidos por atuar. Em matéria de
experiência na lida com a clientela de uma Delegacia, eles, assim como nós da
Volante, eram totalmente"verdes". Imediatamente ficou determinado que a
mulher, dita cabeleireira, seria levada à casa onde estavam seus pertences, para
retirá-los sob nossa proteção. Era uma época chuvosa e, ao saber da missão, um
colega veterano e morador da cidade alertou para o barro que iríamos encontrar
na estrada. Outro agente, novato também, ao escutar a observação do veterano, e contrariando
o costumeiro, prontamente me passou a chave da viatura para que eu dirigisse – a
gente nunca escapa de ter um metido a esperto entre os colegas. Assumi a direção, e digo para quem não sabe, que com mulher polícia, nem o diabo pode! Saímos em direção
ao tal local, levando junto a cabeleireira, seguidos por outro veículo, no qual
estavam os dois delegados. Dizer que fomos para uma estrada embarrada me parece
muito pouco. Era uma meleca só durante todo o caminho, com a viatura rabeando a cada momento. Confesso que jamais havia dirigido no barro. A mulher indicava o
caminho na base dos “dobra aqui e é logo ali”, intermináveis. Chegamos ao local
finalmente; hora de enfrentar a fera drogada. Visualizamos um sujeito na
soleira da porta. Quando avistou quatro policiais com armas na mão, a criatura
passou a choramingar, chamando pela mulher numa cena lamentável. Colocamos uma
cadeira no lado de fora do barraco e algemamos a ela o “perigoso”, para que não
corresse atrás da protegida. Ele só fazia prantear a ingratidão da cabeleireira
que estava por abandoná-lo. Reunidos em trouxas os pertences, saímos em
disparada após soltar o homem, que ainda tentou correr atrás dos carros, tal
como faria um cão querendo alcançar seu dono. A propósito, o nome da mulher era
Vera. Em suas exclamações chorosas com características de estado de embriaguez,
ele lamentava: -Vera, querida, eu “chi” amo! Por que isso, Vera!? Não vai
embora, meu amor!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Na operação resgate dos pertences da vítima, dava para
perceber um certo ar de travessura em nós, policiais. Verdinhos,verdinhos! Havíamos
conseguido fugir do Romeu drogado, embora a persistência dele, por instantes,
até nos tenha feito imaginar o contrário.
Voltamos para a DP com os veículos cobertos de barro, jurando que o
episódio estava encerrado. Só que não! Mas eu só quis dizer. </div>
Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-28253550213813730982011-12-19T21:59:00.000-08:002011-12-20T08:52:16.221-08:00Entre a surra e a Ritalina<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Numa tarde de plantão, entrou na DP uma mulher acompanhada
de um adolescente magrinho, de ar cansado. Não há erro, não, cansado era o
jovenzinho. Logo, eu e meu colega verificamos tratar-se de mãe e filho. O menino
sentou, apoiando os cotovelos sobre os joelhos, deixando que as mãos
sustentassem o peso de sua cabeça. A mãe estava ali para registrar uma
ocorrência. Contou que seus dois filhos eram doentes e tinham problemas,
tomavam remédios receitados pelo “siquiatra”. Que dois indivíduos haviam ido a
sua casa e oferecido trabalhos de cura espiritual, ou coisa que o valha, para
resolver os problemas de saúde dos meninos. Para isso, cobraram a quantia de um
mil e quatrocentos reais. Como o tal tratamento não surtiu efeito, na visita seguinte
dos indivíduos ela reclamou. Os mesmos pediram mais setecentos reais para que o
tratamento fosse concretizado com garantia de cura. Negou-se a pagar, dizendo
que não queria mais saber de gastar dinheiro com um tratamento caro e que não
apresentara qualquer resultado até o momento. Os indivíduos, provavelmente
vendo a possibilidade de lucro frustrada, no dia seguinte esperaram pelo
jovenzinho em seu percurso da escola para casa e lhe aplicaram uma surra
“curativa”, quem sabe uma tentativa de exorcismo. A mãe ficou horrorizada ao
saber da atitude dos supostos curandeiros. Depois do registro, arrisquei
perguntar qual medicamento o guri tomava. Ela informou que o “siquiatra” havia
receitado Ritalina. Perguntei se o menino era hiperativo. Saindo do estado de
mutismo absoluto em que se encontrava desde sua entrada na DP, o menino, branco
como uma vela, levantou a cabeça e respondeu num tom que beirava a irritação:
-Eu não sou hiperativo, eu só não consigo dormir!</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Diante disso, pensei comigo que nem a surra de exorcismo
poderia superar os efeitos da Ritalina mal dosada e administrada diariamente.
Eu e o colega aconselhamos que a mulher procurasse o médico, pois o remédio que
este havia receitado poderia não estar fazendo o efeito necessário, eticetera e
tal. Ela disse que provavelmente procuraria um médico de outra cidade, mesmo
que fosse preciso pagar a consulta, pois não havia outro “siquiatra” na cidade em
que ela residia, que era muito difícil conseguir uma consulta com o único existente.
Apoiei a decisão, pois quem gastou com curandeirismo, certamente poderia pagar
por uma consulta e dar a chance de o menino dormir como qualquer pessoa
precisa. A mulher agradeceu o atendimento e a orientação e saiu, seguida pelo
adolescente insone. Perguntei ao meu colega até quando eu poderia sobreviver
naquele mar de absurdos, sem procurar um “siquiatra”. Rimos e prosseguimos na
nossa rotina nada rotineira, onde tomamos conhecimento de situações inusitadas,
sobre as quais, embora tomados de surpresa, precisamos encontrar palavras de
orientação e conforto. O povo simples, sem cultura, fica a mercê de curandeiros
e de médicos que receitam mas não acompanham os resultados de suas receitas (por
razões que não cabem ponderar no
momento); sofre desnecessariamente em consequência da falta de princípios, das
falhas do sistema de saúde e da ignorância. E o rapazinho insone, fica entre a
surra e a Ritalina. Mas eu só quis dizer. </div>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-35789286093010635662011-10-17T11:30:00.000-07:002011-10-24T22:40:48.071-07:00Entre a vocação e a desmotivação.<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-align: justify;">
Fiquei triste ao saber da morte, em serviço, de um agente, colega da Civil de Caxias do Sul. Não o conheci, mas isso não impediu meu abatimento pela notícia. Ocorre que, na nossa profissão, somos todos ligados uns aos outros de uma forma bastante peculiar. Quando ocorre no exercício funcional, a fatalidade de um tem o peso de alerta para todos. Com a morte de um de nós em serviço, somos lembrados da nossa vulnerabilidade. Todos os seres vivos, ao pressentirem o perigo, tentam sair da situação de risco; o policial, contrariando o instinto natural, deve se deslocar para ela, o que é inerente ao exercício de suas atribuições. Somos poucos, muito poucos, e muito mal pagos para fazer nosso trabalho. Não sou credenciada a falar pelo grupo, no entanto posso falar dos meus sentimentos e daquilo que observo. A sociedade cobra segurança, desvendamento da autoria de crimes, prisão de traficantes e outros criminosos, mas parece ser completamente impermeável às constantes denúncias efetuadas pelos meios de comunicação sobre a falta de efetivo e os baixos rendimentos dos agentes. Parece pouco importar o que há por trás do contexto da segurança pública. E até dou razão a quem reclama segurança, pois os impostos são pagos para tê-la. Como cidadã, também clamo por ela, a fim de que meus familiares circulem em paz, e para, de uma maneira geral, haver qualidade de vida. Entretanto percebo a distância que nos separa desse tão reivindicado direito fundamental, na sua plenitude. Sei também o quanto é árduo o trabalho policial, que busca impedir a proliferação do crime que desassossega a vida em todas as comunidades, independentemente de suas dimensões. Nunca é demais ressaltar a existência de uma administração governamental historicamente falha, relegadora dos serviços de segurança pública. Tanto é verdade, que educação e segurança são os carros-chefes dos discursos de quem pretende se eleger. Depois, conquistada a vitória, inicia-se a tentativa de administrar a insatisfação do povo e dos servidores com verdadeiras esmolas. Somos poucos e fazemos muito com o pouco que nos disponibilizam. Gostaria de ter o dom de transmitir a garra caracterizadora da ação dos policiais em operações. Muitos são jovens, com muito para viver. Todos deixam, em casa, suas famílias, seus amores, e vão cumprir sua obrigação funcional. Cada operação bem sucedida ilumina os rostos de todos, e o sorriso se transforma em regra geral. O ganho mensal, esgotado antes de cobrir as despesas básicas, é esquecido ao realizar a missão. Percebo pessoas vocacionadas ameaçadas pela desmotivação oriunda da falta de reconhecimento, inclusive financeiro. O trabalho realizado nunca é suficiente, pois a criminalidade aumenta exacerbadamente. Entre uma missão e outra, há o tempo para pensar no sentido da permanência na vida policial e nas perspectivas resultantes dela. De volta ao lar, se deparam com os problemas que resultam do dinheiro muito escasso para manter a família. Originam-se, assim, em consequência de uma administração deficiente, agentes desgostosos, para os quais a valorização é uma conquista remota que os assombra até a morte em ação, ou, com sorte, até a morte natural. A despeito disso tudo, uma coisa é certa: fazer parte da Instituição Polícia Civil orgulha e impulsiona ao cumprimento do dever, independente do esforço necessário para empreendê-lo. É o que sinto e o que observo. Mas eu só quis dizer.<o:p></o:p></div>Unknownnoreply@blogger.com2Ozaukee, Wisconsin, USA43.325177679992962 -87.539062519.840025679992962 -127.96875 66.810329679992961 -47.109375tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-58291049060845566952011-08-30T16:53:00.000-07:002011-08-30T16:53:19.567-07:00Pé no barro.<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">Eu, calçando um par de tênis até um certo momento de cor preta. Um dos colega, com botas igualmente pretas, cuidadosamente polidas: um verdadeiro espelho. O barro, ali, desafiando a cada passo. Resignada encarei meu destino. A viatura atolada, o chassi encostado naquela massa avermelhada, e os pneus fazendo cócegas no lodo em seus giros inúteis. Desci do veículo como uma bailarina, na ponta dos pés. Ai, meu Deus, que meleca! Os três colegas falando em empurrar para desatolar. O das botas polidas cuidando para não macular o brilho delas. Decidiram que eu deveria assumir a direção enquanto empurravam. Me dirigi cuidadosamente para a porta do motorista e procurei o melhor local para pisar. Havia um montinho com aspecto seguro, e para ele dirigi meu pé esquerdo. Pisei firme e..., o pé afundou, como se o objetivo fosse fazer uma forma. Puxei de volta, e deu para ouvir o barulho aquoso da sucção do lodo querendo segurar o meu tênis. Por um instante pensei que ficaria só com a meia e teria que resgatar o maldito com as mãos. Pronto, libertei o calçado da lama. Parecia um pé monstruoso, marrom avermelhado sem forma identificável. Entrei na viatura sem conter as gargalhadas, deixando do lado de fora os risos e comentários dos colegas. Dei partida no motor pisando no pedal da embreagem com aquele pé grudento, com uma placa de barro enorme na sola. Ao acelerar dando ré, a roda levantou um esguicho de água lodosa. Deu para ver o desconforto dos colegas, que buscavam empurrar a viatura e fugir do esguicho. Conseguimos mover o carro e adeus barro, adeus botas-espelho. Voltamos para a base. Eu, calçando um par de tênis com um pé marrom e outro preto. Comentamos entre risos sobre o polimento das botas, lamentavelmente perdido na noite de campana, e sobre a cena da qual fui a protagonista. Exausta deixei de lado o tênis bicolor e caí num sono instantâneo, afinal, eram quase cinco horas de uma madrugada fria e molhada. Perto das sete horas tocou o telefone chamando para nova diligência. Olhei para o bicolor e rejeitei a idéia de calçá-lo. Mas, além dele, eu só tinha um par de chinelos de dedo. Imaginei-me chegando ao local do crime com chinelos e meias brancas. Desisti na hora. Fui, então, com a única opção restante; o bicolor, que certamente me deixou com dois centímetros a mais de altura, em vista das placas de barro aderidas às <span> </span>solas. O curioso é que tenho saudade antecipada de tudo isso. É um rito de passagem. Para onde? Não sei, talvez para o mundo das memórias. Mas eu só quis dizer. </div><div class="MsoNormal"><o:p></o:p></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7512438607773257939.post-14982630057141403712011-08-28T18:38:00.000-07:002011-08-28T19:15:38.538-07:00Cabaré<div style="text-align: justify;">Terça-feira, e uma cidade entregue ao sono noturno. O prédio, um esboço a sustentar o telhado. Quando se abriu, a porta deu visão a uma sala de paredes verdes, com toscos desenhos em tinta retrorrefletiva, um verdadeiro susto estético. No teto, um globo espelhado gira, produzindo uma dança de pontos de luz por todo o ambiente. Distribuídas pela sala, três mulheres de olhares desconfiados. Ao fundo, apenas um freguês, dormindo sentado, boca aberta, cabeça apoiada na parede. A música sertaneja muito alta não perturbava seu sono de embriaguez.</div><p class="MsoNormal"><o:p></o:p></p> <p class="MsoNormal" style="text-align: justify;">Uma pequena abertura numa das paredes permitia aos donos do estabelecimento alcançar as bebidas e observar o movimento da sala. Estes, um casal<span> </span>com idade em torno dos cinquenta anos, estavam ansiosos pelo despertar do último freguês, para encerrar a noite e ir para casa dormir. O mesmo ocorria com as mulheres. Nada mais as prendia no local, apenas aguardavam<span> </span>a liberação do casal. Queriam voltar para suas casas, para seus filhos e, curiosamente, uma delas, para o marido. Esta, com quarenta anos e seu marido com vinte e dois: – Guri de boa cabeça – <span> </span>segundo ela. Seis anos de união. Porque no início do namoro o rapaz tinha 16 anos, foi denunciada pela mãe dele e precisou responder na Justiça. Todas elas eram muito bem informadas sobre a Lei Maria da Penha. Uma admitiu ter saído de um casamento por ter apanhado do marido. Nunca mais voltou para o agressor e sustenta seus dois filhos com o que ganha no cabaré. Aos poucos vão ficando mais à <span> </span>vontade, falando sobre suas vidas e, timidamente, fazem perguntas para saciar a própria curiosidade. São mulheres que tomaram um determinado rumo por razões que não nos compete julgar. Carregam o ônus da própria escolha e da própria necessidade. Ninguém os carrega por elas. Com pecado ou sem pecado, não cabe atirar a primeira pedra. São pessoas com sonhos, esperanças e carências, muitas carências. O tratamento sem preconceito entusiasma, tranquiliza; é perceptível no olhar. Vida fácil? Quem disse? Aliás, não é fácil para ninguém, talvez seja para os com tempo livre para disseminar preconceitos. Vida, somente vida. Cada um com a sua história. Mas eu só quis dizer.<span> </span><o:p></o:p></p>Unknownnoreply@blogger.com0